O JACARECANGA E O TREM

 

Entrada da Vila São José.

Via estreita entre os Trilhos e o Muro da Fábrica.

 

A cogitação do Jacarecanga ser contemplado pela ferrovia, se deu ao fato da já existente Companhia da Via Férrea de Baturité, empresa que havia sido criada em 1870. O trem que já circulava por o Centro da cidade pela Rua Trilho de Ferro (Tristão Gonçalves) rumo ao Sul do Estado, desde 30 de novembro de 1873 deveria ser estendido seu trajeto, para região Norte do Ceará.

Houve vários estudos sobre o ponto inicial para a construção de um novo trajeto da ferrovia cearense, agora no sentido Oeste. Relatórios que a empresa ferroviária enviava para o Ministério da Viação e Obras Públicas dão conta de que, no primeiro quartel do século XX a saída Oeste em rumo ao Norte do Estado, seriam Parangaba, Mondubim ou a própria Estação Central.

Prevaleceu a Central, quando foram retirados milhões de metros cúbicos de areia, o que mutilou o Morro do Moinho e o do Croatá, sendo assentado os primeiros trilhos em janeiro de 1916. Foi construída uma ponte metálica para que fosse transpassado o Riacho Jacarecanga, e o trem seguiria em rumo ao Bairro Floresta. Nas construções e prolongamentos, as estações de Antônio Bezerra e Caucaia foram inauguradas em 1917; e posteriormente em 1926 a da Floresta, hoje Álvaro Wayne. Vide no Livro “O Ceará que Entrou nos Trilhos” de nossa a autoria.

                              Álbum da RVC

Ponte Ferroviária do Jacarecanga em 1918

O trem trazendo cargas de Caucaia e Antônio Bezerra

 

 A ponte ferroviária passou pela primeira reforma em 1919. Obedecendo a um plano de mobilidade urbana e precavendo erradicação de acidentes no Centro de Fortaleza, o engenheiro Henrique Eduardo Couto Fernandes conseguiu aprovação e o Ministério da Viação e Obras Públicas autorizou para que, os trilhos seguissem em sentido Oeste, e passassem numa curva à 90º por detrás da propriedade dos Philomeno Gomes.   O Aparelho de Mudança de Via – AMV fora colocado a 150 metros após a transpassagem sobre a ponte do riacho Jacarecanga, devendo os maquinistas fazerem parada obrigatória no local do aparelho. A partir de 1920 a RVC começou a construção e prolongamento da linha que ligaria, o Jacarecanga ao Matadouro (Otávio Bonfim).

A Rede de Viação Cearense – RVC construiu uma casa na beira da linha, onde um Mestre de Linha era responsável por estas manobras, destinando os trens das linhas Norte e Sul. Não conseguimos o nome desse trabalhador da ferrovia, mas chegamos a conhecer a Sra. Isaura (velha Isaura) viúva do ferroviário. Agora espero ter desvendados para os amigos as Vila São José, o porquê daquela casa no meio, como divisória para as avenidinhas das castanholas.

A estação de Otávio Bonfim fora inaugurada em 31 dezembro de 1922, mas devido o nome do Bairro, ainda fora chamada de Matadouro até 1926.

                                  Álbum da RVC

Ponte Ferroviária sobre o Riacho Jacarecanga. 1917.

Ela fora alterada em 1920 como leremos. 

 

                   Reprodução

Casa da Velha Isaura.

 

 Observemos do alto este registro de 1928.

 

Então começou o movimento ferroviário no Jacarecanga, e a Rede de Viação Cearense construiu uma Vila Operária sob a responsabilidade de Jacinto de Matos, em terreno hoje localizado defronte ao Centro de Saúde Carlos Ribeiro. Esse exemplo fora seguido por a firma José Pinto do Carmo, que em 1928 era Fábrica Baturité. Nascia a Vila São Pedro. Entendem meninada do meu tempo, por que o trem no triângulo passava cheirando as portas da casa do Gutemberg?

 

Reprodução do Álbum de Fortaleza – 1931.

Em seu lugar fora construída a José Pinto do Carmo

Foi assim que começou o movimento sobre trilhos no meu Jacarecanga. Com toda essa efervescência do trem como um potencial na economia, surgiu a Casa Machado, Usina São Judas Thadeu (óleo Paturi); lá mais adiante em rumo a Floresta o trem passou a atender a Brasil Oiticica e a Cia Ceará Têxtil; pela linha Sul a Siqueira Gurgel.

Ah! Jacarecanga fora contemplado pelo trem suburbano de Maracanaú, fazendo paradas na Avenida Francisco Sá, pois, até 1980 os moradores iam de trem para o Centro às 6.15 h e 13.15 h, retornando as 11.15 e às 18.30. À noite o trem prosseguia até ao hoje Município de Acarape.

 Pois bem, as linhas Norte e Sul faziam convergência na Estação Central e, no Jacarecanga como linha divisória, formou-se um triângulo, aonde trens cargueiros vindos de Otávio Bonfim para Álvaro Weyne entravam, no mesmo; serviu esse triângulo para as reversões de locomotivas e composições de passageiros. Eu cheguei a ser Buchecheiros junto com a meninada, como se diz: Pegávamos Bigus.

Mas, tudo o que é bom passa. As fábricas inexistem, e com a chegada do Metrô de Fortaleza, desde 2010 que o trem fora arrancado do Jacarecanga.

A Vila São José fica só a contemplar de modo amistoso, a passagem do Veiculo Leve Sobre Trilhos – VLT na linha Oeste, que nem se quer olha para minha Vila. Possa ser à posteriori.

O trem chorando por força do Metrô, abandonou a área e nunca mais passou….

 

                               José Augusto

Local da Parada do Trem Suburbano.

 

                           

                            Do autor

Trilhos pela Rua Jacinto de Matos.

O Muro era a Entrada do Ramal da Casa Machado.

Está hoje tudo diferente.

 

 Inteiração: O TREM DOS OPERÁRIOS

 

Quem foi morador da Vila São José no bairro Jacarecanga no início da década dos anos de 1960, contemplou a passagem de uma locomotiva á vapor, a chamada “Maria Fumaça”, que correndo e bufando pelas válvulas, despertava a curiosidade de todos.

Na minha meninice se existia algo que amedrontava os guris do meu tempo, era aquela coisa preta correndo e cantando o poema de Manuel Bandeira “Café com Pão”. Pobres crianças! Não puderam alcançar emocionante viagem de trem com máquinas à lenha, afinal a última locomotiva desse tipo circulou no Ceará em 1 de janeiro de 1963.

Mas, que trem era aquele? Respondeu-me um ferroviário: “É o trem dos operários das oficinas do Urubu”. A Vila onde nasci acompanhava todo o movimento ferroviário, pois, é lá onde havia a separação das linhas de Baturité e Sobral formando o triângulo aonde, ainda se faziam as reversões.

Em 1972 ingressei no Colégio ginasial José Waldo Ribeiro Ramos (ex-Centro Educacional Ferroviário), tornando-me passageiro do trem dos operários. Para orgulho nosso, nesse trem tinha um carro exclusivo para os estudantes. Passei então do lado de fora, para o de dentro. A composição tinha cinco carros e era assistida pelo condutor de nome Daniel, que revezava com o Sr. Antônio.

A Partida do trem dos operários da estação Prof. João Felipe, era às 6.30 h e tinha 12 minutos de percurso obedecendo as seguintes paradas: Padre Mororó, Marinha, Vila Assis, Francisco Sá, Av. Pasteur e a estação de Álvaro Weyne que, na época era depois da passagem de nível da Av. Dr. Themberg.

Quando aluno/ passageiro desse trem, o mesmo era puxado pelas locomotivas   Brockville (pequenina) e a Whitcomb nº 623 que tinha motor de caterpillar (era um barulhão!).

Em 1981 ingressei no quadro de funcionários da RFFSA (extinta). Então com muita responsabilidade, passei a ter acesso a documentos, oportunidades para entrevistas, reprodução de fotografias e assim resgatar a história daquele trem de minha infância.

Portanto, recuemos no tempo.

# As oficinas da então Estrada de Ferro de Baturité foram inauguradas aos 9 de junho de 1880, sendo diretor da Companhia o Engº Amarílio Olinda de Vasconcelos, que nomeou José da Rocha e Silva para ser seu mestre geral. Devido ao crescimento da Empresa, expansão no pátio de manobras, a construção de armazéns e uma grande reforma por que passou a RVC em 1917, a Estação Central não podia mais comportar os trabalhos de manutenção mecânica. Então foram iniciados os estudos quanto ao local da futura instalação das oficinas.

Em 1922 o Sr. Antônio Joaquim Carvalho Junior (Cel. Carvalho), havia doado para a União um terreno no bairro do Urubu, bem na beira da estrada da Barra do Ceará. A Rede de Viação Cearense nesse tempo estava sob o comando da Inspetoria Federal de Obras Contra as Secas – IFOCS, atual DNOCS.

O Inspetor Arrojado Lisboa conseguiu junto ao Governo federal que, o referido terreno fosse destinado para a RVC e assim, construir o tão almejado complexo arquitetônico. Com o terreno à disposição da RVC e já sob o comando de Demósthenes Rockert, o engenheiro Otávio Bonfim ficou como encarregado para consolidar o projeto junto a Firma “Alfredo Dolabela Portela & Cia”. Assim em 1929 com os galpões já prontos, começaram o translado das máquinas e o material pesado.

Enfim na gestão de Abraão Leite, aos 4 de outubro de 1930 ocorreu a apoteótica inauguração das Oficinas. Por portaria, é criado o “Trem dos Operários” que passaria a ser tracionado por uma locomotiva “The Baldwin Locomotive Work” tipo 0-4-0, cuja fabricação é de abril de 1922. Essa é a máquina que depois assombraria as crianças, da minha bucólica Vila da Usina São José.

Pois bem, em 1977 o Eng. José Walter Barbosa Cavalcante (Prefeito José walter) que era o Superintendente Adjunto de Operações – SOP, determinou sua erradicação

É como disse Raquel de Queiroz: “Menino criado em beira de linha fica com o trem no sangue”.

                    Álbum da RVC

 Trem dos Operários tracionado pela Locomotiva Baldwin nº 30.

 

                            Foto do autor

 Locomotiva 30 ainda preservada

 

 

 HIDRÁULICA DA VILA SÃO JOSE

 

   Desenho da Rua Messias Philomeno entre ruas Júlio César e Leda.

 

Água é Vida”, e por ser um termo tão usado, parece ficar redundante. Estudos revelam que a doença hídrica não é pela água em si, mas devido o mau uso ou conservação. Existe o institucional que é voltado para recursos hídricos: Funceme, Cogerh, Cagece, os Institutos de análises além de setores de pesquisas de Universidades e/ou Faculdades.

Às vezes por faltar estudo técnico, certos projetos de edifícios, bem como conjuntos habitacionais sacrificam a Companhia fornecedora de água, porque se faz necessário a mesma atender as novas demandas.

Na Vila São José, o recurso hídrico só foi importado a partir de 1963, quando o Coronel Philomeno autorizou as vias de pedras toscas serem escavadas pelo Saagec (Serviço de Água e Esgoto do Estado do Ceará). Era chegada a famosa Água do Acarape. Chafarizes com cacimbões ao lado ou abaixo da base forneciam primitivamente, água para a Vila Operária.

O primeiro construído foi na Rua Maria Estela, primeira rua também construída em 1926. Recebia o líquido precioso da Fábrica São José, proveniente de um poço profundo defronte a estamparia de acabamento das toalhas. A tubulação de 100 mm, transpassava o riacho Jacarecanga. Era sustentado por duas bases de cimento armado.

                       

Vista do Primeiro Chafariz da Vila  Rua Maria Estela.

Depois na entrada da Vila, pelo lado Sul início da rua Dona Maroquinha, esquina com a rua Maria Isabel, a segunda caixa d’água. Era um reservatório de 20 mil litros, com altura de 15 metros. Tinha um espaço retangular onde tinha duas casas arredondadas parecendo duas ocas, de cor cinza, erguida com tijolos batidos e cobertas com telhas do Maracanaú.

Uma das casas era acompanhando a base do reservatório que deveria abastecer as residências por gravidade. A outra era conhecida como Casinha da Bomba. Tinha a bomba hidráulica impulsionada por um motor de 10 cavalos, alimentado com 380 Volts, puxados por uma correia de 1,5 metros. A chave elétrica era do tipo faca com fusíveis de cartucho ambos fabricados pela Westinghouse – USA. O bombeiro hidráulico era o Antônio e o eletricista seu Mozart. O Telles que herdaria aquele pedaço para fazer um bar, era o fiscal do Coronel proprietário. A cacimba era no meio da que seria avenidinha Sul, onde moraria o Chico sete cão.

Segundo o pai do escritor Valdemar de Lima, aquela primeira etapa funcionaria até 1966, porém, houve um aditivo para atender as construções da segunda etapa da Vila São José em 1946. O primeiro reservatório da segunda fase, foi na Avenidinha pelo Norte, ao lado da Via Férrea de Baturité, da RVC. O cacimbão localizava-se à sombra de uma das castanholeiras, que eram em número de duas. Dessas octogenárias árvores só uma existe, e a caixa d’água e a cacimba que era forma de disco voador, desapareceram.

                                                      Caixa D’água do Seu Telles

                                 Do autor

Caixa d’água da Rua Leda

Do seu Telles na frente. De lado as Castanholeiras.

Foto colhida do Edifício único existente na Vila.

Na construção já mencionada e lá se foram 76 anos, tinha na rua Leda dois reservatórios. O autor não alcançou seu funcionamento, mas chegou a ver as instalações com canos vencidos pela corrosão e válvulas brecadas pelo desuso. Os motores já haviam sido retirados restando a base abandonada com parafusos ereto e ranhuras avariadas. Os poços para alimentar as caixas d’água da rua Leda era aonde posteriormente, se estabeleceu para comércio dona Francisca, a qual transferiu o comercio mercearia bar para o Olavo bigodão. Ainda lembro de um porte da Conefor que ficava ao lado pela rua Maria Estela, onde um caixa de madeira protegia a chave geral da iluminação pública da Vila. Ao escurecer vinha um funcionário da fábrica e ligava, se responsabilizando o mesmo a desligar com o clarear do dia. Eram várias arandelas com lâmpadas incandescentes que pastoravam as ruas para nós. Ainda era a Conefor, extinta em 1971. Depois a Vila fora beneficiada com lâmpadas fluorescentes, mas com manutenção já da Coelce e na tecnologia do Foto sensor.

Continuemos:

O poço na casa em que moraria o Chico Sete Cão na outra Avenidinha sentido Sul, (já foi escrito) era para auxiliar na demanda oferecida pela caixa d’água já mencionada na Rua Dona Maroquinha. Lá tinha um portão para a Rua Maria Isabel. (Vide contracapa onde vemos a caixa d’agua e o Poço mencionado).

Pessoas inteligentes criam oportunidades. Tomando conhecimento dessa demanda reprimida, um empresário cujo nome não me ocorre, começou a vender água em carros pipa vindas de um poço profundo do bairro Floresta. Os baldes de zinco com capacidade para dez litros e custavam Cr$n 0,50 (cinquenta centavos do cruzeiro novo), moeda que circulou tão logo fora criado o Banco Central do Brasil, no Governo Castelo Branco.  Os caminhões GMC funcionavam à base de manivela, e as carrocerias eram tanques de madeira calafetada.

Ah! já ia me esquecendo! As carroças do Mestre Carlos, que por apelidar seus animais, tornou-se tipo popular na Vila São José. A carroça Pombo Roxo era tracionada pela margarida (burra branca); a Pombo Cardo era com a rosinha (burra avermelhada) e tinha o cavalo Gaspar que morreu. Os travessos Garotos ajudavam o Mestre Carlos naquelas entregas. O poço de abastecimento daquelas carroças ficava ao fim da Avenida Duque de Caxias, Morro do Ouro, olhando para o Cercado Zé Padre.

 

Essa é a atual Avenidinha lado Sul. O Poço da casa do Chico sete cão,

 É hoje o sobrado com Portão de alumínio. Posando Jadiael filho do autor.

 

Sob a forma de Empresa de Economia Mista, a Companhia de Água e Esgoto do Ceará – Cagece foi criada através da Lei 9.499, de 20 de julho de 1971, e absorveu o Saagec, bem como todas essas peripécias com água. O contingenciamento passou ao compasso de Estatal. Por pouco não se destruiu deste capítulo sua história.

Cesar Cal’s e Vicente Fialho modernizaram o sistema em todo o Jacarecanga, ao qual por sua vez, Adauto Bezerra fez a parte de esgoto. Na Vila o homem dos esgotos era o Pedro velho, um protagonista comparado aos carregadores de Quimoas, na Fortaleza antiga. Vide foto na página seguinte.

Retroagindo um pouco. Quanto ao tratamento e atendimento de águas das fontes da VSJ, nunca se ouviu falar em conta. Era uma cortesia do Coronel Philomeno aos seus operários.

A light/Conefor estas tinham, e com péssimo atendimento em um prédio histórico no Passeio Público. O Coronel tinha consciência da utilidade do líquido precioso, e dispensava de seus empregados.

Água era o que não faltava. A vila só não foi mais ornamentada, culpa dos moradores que pisavam na grama. A placa estava lá, mas servia de alvo para os travessos, com estilingue.

A Vila do Jacarecanga pobre, é rica em histórias.

É um anoitecer da história. Vejam o estado atual.

Esse é o monstrengo da que foi a caixa d’água Ícone da Vila.

Parada obrigatória para quem quer se usufruir do bar do Telles,

Mas para quem foi morador antigo; se parar vira o Muro das Lamentações.

 

      Interação Histórica:          

                                   Álbum do Boris

Aspecto da Rua Pitombeira, atual Floriano Peixoto em 1906.

As caixas que vemos de madeira, eram os depósitos do material fétido das residências, pois, não havia saneamento.  Os homens que trabalhavam naquilo eram chamados de quimoeiros. Eles levavam a caixa para a praia Formosa para descarregar e lavar os depósitos.

Na passagem pelas ruas, tiravam o povo das calçadas.

 

 

 

RELEMBRANDO AS TERTÚLIAS NO JACARECANGA

 

Turma da Boca de Sino

A dança caracteriza-se pelo uso do corpo, seguindo movimentos previamente estabelecidos (coreografia) ou improvisados (dança livre). Na maior parte dos casos, a dança, com passos ritmados ao som e compasso de música, envolve a expressão de sentimentos potenciados por ela.

A dança é uma das três principais artes cênicas da antiguidade, ao lado do teatro e da música. No antigo Egito já se realizava as chamadas danças astro-teológicas em homenagem a Osíris. Na Grécia, a dança era frequentemente vinculada aos jogos, em especial aos olímpicos.

No curso de nossa vida duas coisas são indeléveis. Essas gravações devem-se as energias sensitivas da audição e o olfato. Traduzindo são coisas marcantes: Perfume e música, em que evocamos uma combinação feliz do maior brega/chique do Brasil Waldick Soriano, quando gravou a música “Perfume de Gardênia”.

Mas vamos lá. O bom é que na época das tertúlias, as moças e os rapazes se afinavam e dançavam até por todo o tempo, pela combinação de essências. Muitos se queixavam de rejeição ao convidar uma menina para dançar; mas tinha lógica. O cabra usava perfume feminino e a pessoa se sentia como se estivesse com alguém do mesmo sexo. Mulher também não deve usar fragrância masculina. Sabiam que isso funciona no psicológico? Agora, não existia naqueles bons tempos, nada de marcas famosas tais como hoje, com fragrâncias passando da casa dos R$ 100 (Cem reais).

Também nem tanto como “Leite de Rosa” e creme “Trim”. Ahahaha…

As calças eram boca de sino, blusão por dentro, e o medalhão só perdia para o de Erasmo Carlos. Não se fumava dentro do recinto, onde a luz negra tornava a sala um escurinho de cinema. Quem quisesse acender seu hollywood, Minister, Albany, Charm, Marlboro, Consul, Camel Filters (o mais caro) ou até mesmo o Continental, deveria sair para a calçada e após o uso, chupava Piper ou azedinho para mudar o hálito. Caramelo do Zorro e o Negrito eram chocolates e pregavam nos dentes. Chicletes Adams, Ping Pong, Ploc, idem. O Manuel Pé Cagado levou um spray bocal para se amostrar, e a válvula estourou quase cegando uma menina, e tome vaia.

As casas mais tradicionais em cederem espaço para as tertúlias na Vila São José eram as residências do Tutuca (Elenilson), da amiga Ilná Sousa e a Tayse que já ficava na Avenida Francisco Sá no entorno do SAPS. Tayse era namorada do Magão que na época morava na casa do Artur, grande zagueiro do Ceará Sporting Clube. Agora vez por outra a Núbia, filha do seu Zuza fazia também. Era na Coronel Philomeno nº 29.

A publicidade da tertúlia era notória, pois, o anfitrião saía nas casas solicitando por empréstimo, discos de vinil. Portanto era nossa parceria, bem como ficar próximo da vitrola virando e sequenciando as músicas. Como a dança era de cerca de três horas, nunca uma música era repetida. Na rua já ouvíamos com Roberto Carlos “Debaixo dos caracóis dos seus cabelos”, “A Distância”, “Maior que meu Amor” “Amanda Amante”; Os Pholhas “I Never Did Before” (Nunca Fiz Antes); Roberta Flack “Killing Me Softly” (Matando-se Suavemente); Stevie Wonder “You Are Sunshine Of My Life” (Você é forte luz em Minha Vida); Demis Roussos “Forever and Ever” (Sempre pra sempre); The Fevers “Mar de Rosa”, “Vivo a Sonhar com Você”, “Ninguém Vive sem amor”. Tinha também músicas eróticas como “Theme Love Airport” (Tema romântico do Aeroporto) com Vicente Bell; “Nuvens, Amar Sonhar Sofrer”, JET´AILME… mol non Plus Erótico (Eu Te Amo em francês) e por ai ia………

 

O Disco de Vinil foi uma marca nas Tertúlias.

Todos os bailes da Vila São José eram na própria vila, com exceção do Carnaval e Natal que era no Clubinho Marcílio Dias, na Avenida Philomeno Gomes, por detrás do Cemitério São João Batista, depois do muro da fábrica de tecidos.

Quem é que queria saber e, também não podíamos!!!! Náutico Atlético Cearense, Maguary, Diários, AABB, Clube de Regatas nem mesmo os clubes suburbanos que desapareceram, como podemos citar: O Uberlândia no Padre Andrade, Secai no Pirambú, Carlito Pamplona na Avenida Pasteur, Grêmio Recreativo dos Ferroviários na Francisco Sá, Internacional no Monte Castelo, Romeu Martins no Montese e o de Antônio Bezerra. Não, todos ficavam na Vila São José, porque aquele pedacinho tinha tudo de bom.

No escurinho, a gente combinava para chocar um casal com outro. Se a jovem esboçasse desconforto, ficava como estava, mas do contrário a quentura do corpo (pinar mesmo) tornava mais gostosa a dança.

Eram assim as tertúlias. A única despesa que tínhamos era quando o calor se intensificava nos dirigíamos, ao Bar do Chico Lima e/ou do Seu Telles para comprar refrigerantes como Blimp (sabor Limão), Crusch (Laranja de verdade) e Grapette (Quem bebe repete, uva).

 

 

 

 

 

Marcas de refrigerantes da época

Os dois incidentes de que recordo: o primeiro foi na casa de um em que a Conefor (atual Enel), no dia da festa cortou a luz pela parte da tarde. Nada se podia fazer porque era num sábado. No outro incidente que também não irei mencionar a casa, ao fazerem a festa nos deixaram de lado, trazendo gente estranha, querendo ser os Reis da Cocada Preta. Naquela ocasião o jardim do Seu Panchico foi visitado quando lhe subtraímos pimentas malaguetas de seu jardim/hortaliça.

À noite ao chegarmos à festa sem convite, discretamente soltamos pimenta ao chão. Daí começou a espirradeira e coceiras nos olhos e a festa acabou.

Então veio a colheita desta travessura de mal gosto. Seu Panchico foi ao Padre Mirton Lavor, pároco da Igreja dos Navegantes e cabuetou (à brasileira) aquela travessura. No sermão de sábado à tarde, ele baixou o Pau dizendo que “quem entrasse nos jardins alheios sem permissão, era ladrão e salteador”. Todos baixaram as cabeças.

Aí os tertulianos ficaram bonzinhos. Quem achou ruim foram algumas meninas sapequinhas, mas nós que levamos o arregaço do sacerdote, passamos a obedecer ao para-choque de caminhão: dançando “mantendo a distancia”. Voltou-se as danças soltas tal qual o Twist, e I iê iê iê.

Em tese tudo o que é fora do seu tempo, não presta. Mas as tertúlias marcou a juventude de seu tempo.

 

Marcas de Cigarros e refrigerantes

 

 

Fonte: Histórias do Jacarecanga (A vila São José que eu vivi), Visual art 2019.  Francisco de Assis Silva de Lima.

NO MORRO DO CROATÁ A COMISSÃO BORBULETA

 

Registro raríssimo da comissão no Croatá

No terreno onde seria estabelecida a Cidade de Fortaleza, no século XVI ainda existia domínio indígena até que os holandeses conseguiram em meio a massacres se estabelecerem. Matias Beck (comandante Flamengo) ergueu o Forte de Schoonemborch, com a finalidade de se defender dos nativos aliados aos portugueses, às margens do Riacho Pajeú no monte Marajaituba (hoje 10ª Região Militar).

Pois bem, ao Oeste do Forte no mesmo nível, estava “O Morro Croatá” que serviu de base militar no século XVII, e que posteriormente em 1859 por ordem da Corte fora construído um observatório astronômico.

 

 

Nas escavações na Estação Central,

provas arqueológicas da Base Militar

 

Estudos humanísticos buscavam a “Origem” do Brasil por sua história, enquanto cientistas ocupavam-se na análise dos recursos naturais por todo o Brasil. O imperador criou em 1856 a comissão científica.

Em 1859 fora instalada em Fortaleza a comissão que, fora denominada; Expedição das Borboletas.

O Ceará como uma província inexplorada em seus recursos de jazidas, flora e fauna, fora a motivação para a instalação dos instrumentos científicos da época, pois estava na pauta estudo climatérico, visando amenizar o sofrimento do povo, vítima de constantes estiagem.

A expedição tinha na equipe botânicos, etnólogos, geólogos, zoólogos dentre outros, todos vindos da Corte no Rio de Janeiro, cujo desembarque ocorreu no Poço das Dragas, antigo trapiche Ellery.

Foi no solo deste registro raro, que que fora inaugurado o Campo da Amélia, e que fora escolhido para ser erguido a partir de 1870 o complexo que se denominaria “Companhia Cearense da Estrada de Ferro de Baturité” como leremos.

Ao lado desse observatório ficava o “Campo da Amélia”, que inaugurado em 29 de junho de 1830 onde homenageou a II Imperatriz do Brasil, D. Amélia Leuchtthemberg. Foram plantados neste campo vários juazeiros e, um bonito gramado divido em quadras. Conta-se que foi de onde surgiu a redundante frase: “Não pise na grama”.

Localização do Campo da Amélia.

 

O assentamento da pedra fundamental para o início da construção da Estação Central, ocorreu no final da tarde de 20 de janeiro de 1872, estando presente o Comendador João Wilkens de Matos, Presidente da Província , e  seu antecessor, Conselheiro Barão de Taquari; estiveram também, Corpo Legislativo, autoridades civis e militares, funcionários públicos, Clero, Nobreza e Populares.

Neste Registro observamos as duas fachadas: 1873 e 1880

 

A colocação da Empresa em terreno no Morro do Croatá, foi como mandou a tradição “Num ponto que também fosse vista para o mar, como era o forte, o hospital da misericórdia e a cadeia pública. Assim a estação obrigaria o navegante bem de longe aproximar-se com respeito”. João Nogueira

Arquiteto austríaco Henrique Folgare

Projetou a Estação Central de 1880.

 

Fontes:

Fortaleza Velha, João Nogueira, 1954, Edição UFC, 1979;

Instituto do Ceará

Registro Fotográfico de domínio Público.

GRITANTES VENDEDORES NA VILA SÃO JOSÉ – JACARECANGA

Rua Dona Bela era a Rua dos Comércios

 

 Era gostoso o amanhecer do dia na Vila São José nos dias de verão; a estrela D’alva ainda não tinha sida ofuscada pelo alaranjado raio do astro-rei; dava-se para ouvir o suar das ondas em dias de mar bravio no Pirambú; uma delicia o refrescante vento assobiando no encontro da instalação elétrica dos fios da Conefor (hoje Enel) e, fazendo deitar galhos finos das árvores mais altas.

O barulho só começava às 6 h quando a fábrica São José iniciava suas atividades, nos teares (tecelagem) e quando os trens suburbanos da RFFSA apitavam. Assim começava a poluição sonora, mandando paulatinamente ir embora o sossego noturno.

Os pássaros rolinhas (caldo de feijão e cascavel), com seu melancólico e redundante cântico de modo uníssono, se alegravam pousados na linha telegráfica do trem, nos impondo responsabilidade.

Agora, tinha algo atípico que, culminou em típico na cultura peculiar de nossa Vila Operária? Tinha sim: eram os Gritantes vendedores de porta!

O primeiro era o homem da tapioca: “Tapiiooooca”. Por muitos anos ouvia-se essa voz, mas isso não agoniava quem estudava no Grupo Escolas Sales Campos no turno da tarde; não se via os donos de casa sair.

Um dia por curiosidade alguns meninos saíram pra calçada: de calções e cabelos assanhados, declinaram olhares para a Rua Coronel Philomeno, e o homem ainda ia passar. vindo da Rua Dona Bela. De súbito, entrou um cidadão alto, moreno, chapéu de palha e um caixote todo forrado com palhas de bananeira. Era o tapioqueiro.

O homem da verdura passava perto das 7 horas. Aquele verdureiro era o mais conhecido, pois, era o pai de uma mocinha que era secretária do lar (seu nome agora me escapa). Trabalhava na casa do Wilson “Bucho Branco” que era gerente da desaparecida Lanchonete Miscelânea na Praça do Ferreira, vizinho ao Posto Mazine na Fortaleza antiga.

Sem hora prevista vinha o homem do “Meeeeeeeel”. Equilibrava com uma rodilha um vasilhame tipo leiteira e vendia seu produto natural: “Hoje é de jandaíra, é das Italianas” e por aí ia. Hoje a nutrição policia-nos devido doenças tipo diabete.

 

Vendedor de Chegadinho

 

Já ao meio dia com alunos fardados para irem ao Grupo Escolar Sales Campos, chegava o “Fedorento” do Picolé. Tomou esse apelido, devido o causticante sol que o fazia transpirar sem a assepsia nas auxilia. Era um quarentão de pele morena, e que estacionava a carroça debaixo de nosso Fícus-benjamim e que, sem nenhuma justificativa fora derrubado em 1975, na Rua Coronel Philomeno defronte ao nº 43, minha residência.

Convém registrar que, próximo ao meio dia a colossal chaminé da Usina São José expelia fumaça da descarga, quando a caldeira que ficava na estamparia, bufava. No céu da Vila ficava uma nuvem de fumaça branca não poluente que, devido a altura do cano não atingia as casas, mas que se vivenciava uma espécie de eclipse, pois, o dia mudava de cor.

A noite tinha mais dois vendedores de picolé. Um que dizia” Mel, mé Mel” e era distribuidor dos gelados da Sorveteria Gury; O “Ceará” era o outro que, largava a carroça e começa a se estrebuchar no chão, quando alguém dizia que ele era torcedor pelo Fortaleza, rivalidade no futebol cearense.

Antes de passar as novelas, vinha o “vendedor de chegadinho” e a sua chamada era com o triângulo. Eram folhas crocantes de trigo e outros produtos que pareciam folhas de pé de castanhola assadas.

 

Apareceram também uns pipoqueiros vindos do Bairro Carlito Pamplona que ficavam na esquina da casa do Dédé banbulê na Rua Dona Bela.

 

Aos fins de semana vinha o pipoqueiro que morava na Rua Padre Mororó, quase defronte ao Santa Cruz Sport Club por o lado do Sol. Sua chamada era: “Pipoqueirooooo, chegou o cheiroso!”. A noite era o vendedor de algodão doce. Como ele pouco falava, levou pela corriola o nome de “Caladinho”. Eram demais as opções de vendas e a Vila São José era movimentada. Os nossos pais que se aguentasse.

Naquele tempo se dizia: “Trabalhar por Conta Própria”, hoje é “Integrante do Mercado Informal”. Todo trabalho é digno, e não fazia vergonha gritar para vender, diferentemente de hoje, que para vender é preciso ter público alvo, logística e custo benefício.

O trabalho hoje exige uma formatação, uma didática. Milhares de brasileiros se contentam com empregos mesquinhos, parcos salários e condições de vida inferiores, porque se levam uma existência por hábitos de negligência, inexatidão, impontualidade, tudo pela falta de vontade.

Mas…. Foram bons aqueles anos para os infanto-juvenis que nasceram, cresceram e moraram no Jacarecanga, na inesquecível Vila São José. Quem hoje chega lá, se lembra do último parágrafo do romance Iracema de José de Alencar:

 TUDO PASSA SOBRE A TERRA.

Vendedor de Algodão Doce

 

 

Casa do Wilson “Baixin”, que era ponto de venda de Algodão Doce.

Era vizinho ao Chico Lima que ficava na Rua Dona Bela.

Observa-se nessa casa um circulo na parede.

Era uma coisa original nas casas antigas na Vila. (1926)

BONDE TEM HISTÓRIA E O JACARECANGA FAZ PARTE.

 

Bonde do Jacarecanga

 


  Bonde Soares Moreno.

 

 Jacarecanga como poucos bairros, teve o privilégio de emprestar seu solo para aquele tipo de transporte ferroviário, quando começou o seu serviço já na tração elétrica.

A Companhia Ferro Carril que tinha um prédio administrativo na Praça do Ferreira, foi inaugurada aos 24 de abril de 1880 com 4.210 metros de linhas para bondes de tração animal, cujo contrato para assentamento dos trilhos, remota ao mês de agosto de 1875.

 

 Ponto de Partida da Ferro Carril

Ficava na Rua da Intendência por detrás do Café Java

Praça do Ferreira

 

Bondes de Tração Animal

 

 

 

 

 

O ponto zero era na Praça do Ferreira de onde partia todos os bondes, sendo os primeiros para a Estrada de Messejana (Visconde Rio Branco) e para o Matadouro Público (Hoje Bairro Farias Brito), próximo onde funcionou a desaparecida Estação ferroviária de Otávio Bonfim, na Estrada do Barro Vermelho (Avenida Bezerra de Menezes).

 

Como surgiu o Bonde Elétrico em Fortaleza

Em 17 de junho de 1910, com a apoteótica inauguração do Theatro José de Alencar na então Praça Marquês do Herval, muitos europeus vieram para aglutinar os efusivos aplausos por a abertura dessa casa cultural.

 

O assunto de Bondes Elétricos foi ventilado por um grupo de ingleses em uma reunião de acolhimento em casa do Presidente do Ceará Antônio Pinto Nogueira Accioly; ao Intendente de Fortaleza Guilherme Cesar Rocha; ao Secretário da Fazenda Raymundo Leopoldo Coelho Arruda e ao Presidente da Assembleia Legislativa deputado Belisário Cícero Alexandrino.

 

Já que o Theatro havia sido inaugurado numa sexta-feira, o fim de semana foi aproveitado para esta conversa aparentemente amistosa mas, amadureceu quando saiu um protocolo de intensões. A casa do Presidente Accioly ficava na Rua da Municipalidade, esquina com Rua 24 de maio.

 

Casa de Nogueira Accioly

 

Então, no dia 08 de maio de 1911, cria-se a Usina de Luz e Força do Passeio Público, da firma The Ceará Tramway Light & Co. para alimentar os bondes, que eram de tração animal e passariam a ter tração elétrica. Assim caducaria o contrato com a Ferro Carril, que já pertencia a J. Pontes & Companhia.

 

O lançamento da pedra fundamental, da usina e casa das máquinas para bondes (Tramway) elétricos de Fortaleza, da The Ceará Tramway Light & Co.  no Passeio Público (Usina) ocorreu no dia 9 de maio de 1912. Já a Central foi localizada no chamado calçamento de Messejana, depois Boulevard Visconde do Rio Branco, entre as ruas Padre Valdevino e a Rua da Bomba (hoje Rua João Brígido).

 

A história dos bondes tanto tração animal, como a elétrica é extensa, por isso quero me deter ao Bonde do Jacarecanga, recapitulando apenas que aos 8 de maio de 1911, havia sido criado a usina de força e luz do Passeio Público, da Firma Ceará Tamway Light & Company, para alimentar a tração elétrica dos bondes, erradicando os de tração animal.

 

Dentre as eram onze linhas criadas pela Light, apenas duas serviam ao bairro Jacarecanga: Soares Moreno e o de Jacarecanga. Os bondes da linha Soares Moreno tinha o seguinte trajeto: Praça do Ferreira → Rua Guilherme Rocha → Rua Tereza Cristina → Rua Castro e Silva → Padre Mororó fazendo ponto final na esquina da Rua Francisco Lorda, na época Tijubana, e que já havia sido chamada de “Travessa Camocim”. O de Jacarecanga iniciado em 1914, fazia o mesmo percurso do Soares Moreno, com o seguinte aditivo: da Rua Guilherme Rocha, seguia para a Praça Fernandes Vieira (Atual Gustavo Barroso), fazendo o contorno até levarem os alunos na porta do Colégio Liceu e da Escola Fernandes Vieira.

 

Em 1926, o industrial Philomeno Gomes, junto com o Desembargador Moreira, usaram do prestigio e conseguiram com a direção da Light para que, a linha do bonde Jacarecanga fosse até defronte à recém inaugurada fábrica de tecidos São José, beirando a linha do trem da Rede de Viação Cearense.

 

O autor destas linhas ainda alcançou a abandonada casinha de força e uns velhos cabos elétricos caídos, e cortados num poste de ferro, no canto Noroeste do Cemitério São João Batista. Aqueles materiais entregues às intempéries foram os últimos detalhes que provaram às futuras gerações a existência de que, Jacarecanga teve bondes. Os detalhes desapareceram em 1969.

 

Bonde Jacarecanga entrado na Rua Guilherme Rocha.

 

 Rua Princesa Isabel com Guilherme Rocha

Transitava o bonde de Jacarecanaga e Soares Moreno que entrava na Rua Teresa Cristina

 

Rua Castro e Silva com Teresa Cristina

 

Avenida Philomeno Gomes em 1926.

 

Quando o bonde circulava a Praça do Liceu.

O casarão dos Morais Correia era o início da Av. Francisco Sá.

 

 

Os moradores antigos e os que moravam na Vila São José nos anos de 1960/70 ainda se lembram, que os ônibus do empresário Oscar pedreira quando vinham do Centro pela Rua Guilherme Rocha, contornavam a Praça do Liceu, e ficavam em tangente para entrar na Avenida Philomeno Gomes, só dependendo dos semáforos instalados em 1965. Achamos que aqueles ônibus seguiam a sombra dos bondes elétricos que transportaram nossos ancestrais, de 1914 até 1947, quando desapareceram de vez.

 

Não ficou um só exemplar para à posteriori, nem mesmo trilhos para contar a história, daí minha lamentação pelo desaparecimento da Casinha de Força, que nenhum mal fazia; apenas confirmava a história. Dentro do terreno de Cemitério, quem iria se incomodar, eita falta de visão histórica – cultural.

 

O pai do escritor, Valdemar de Lima, morando na Vila ainda fez uso do bonde para o Centro, e foi este fragmento por ele contado, que aqui foi descrito.

 

Ônibus da Manutenção Elétrica

 

Ponto de Partida dos Bondes Elétricos.

Praça do Ferreira

 

 Fonte:

Histórias da Vila São José, “O Jacarecanga que eu vivi”

Fotos: Álbum do Mr. Hull, Marciano Lopes e Arquivo Nirez.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

O JACARECANGA E O TREM

 

 

Entrada da Vila São José Antes de Ontem e Ontem. 

(1961 e 1982)

Via Estreita entre os Trilhos e o Muro da Fábrica.

 

A cogitação do Jacarecanga ser contemplado pela ferrovia, se deu ao fato da já existente Companhia da Via Férrea de Baturité, empresa que havia sido criada em 1870.

O trem que circulou no Centro da cidade pela Rua Trilho de Ferro (Tristão Gonçalves) rumo ao Sul do Estado, oficialmente desde 30 de novembro de 1873, deveria ser estendido seu trajeto para região Norte do Ceará.

Houve vários estudos sobre o ponto inicial. Relatórios que a empresa ferroviária enviava para o Ministério da Viação e Obras Públicas, dão conta de que na primeira década do século XX, a saída Oeste em rumo ao Norte do Estado, seria Parangaba, Mondubim ou a própria Estação Central.  Prevaleceu a Central, quando foram retirados milhões de metros cúbicos de areia, mutilando o Morro do Moinho e do Croatá sendo assentado os primeiros trilhos em janeiro de 1916. Foi construída uma ponte metálica para que fosse transpassado o Riacho Jacarecanga, e o trem seguiria em rumo ao Bairro Floresta. (Estações de Antônio Bezerra e Caucaia foram inauguradas em 1917, e posteriormente em 1926 a da Floresta, hoje Álvaro Wayne). Vide o Livro “O Ceará que Entrou nos Trilhos” de minha autoria.

 

 

Ponte sobre o Riacho Jacarecanga em 1912

O Trecho em Construção já Estava chegando na Floresta

Foto Colhida do Lado da Marinha

 

A ponte ferroviária iria passar pela primeira reforma a partir de 1919, quando não haveria mais condições dos trens trafegarem pelos perpendiculares à Avenida Tristão Gonçalves. Então obedecendo a um plano de mobilidade, o Doutor Henrique Eduardo Couto Fernandes conseguiu aprovação e o Ministério da Viação e Obras Públicas autorizou para que, os trilhos seguissem em sentido Oeste, e passassem numa curva à 90º por detrás da propriedade dos Philomeno Gomes.   O aparelho de mudança de via foi colocado a 150 metros após a transpassagem sobre a ponte do riacho, devendo os maquinistas fazerem parada obrigatória no local do aparelho. A partir de 1920 a RVC começou a construção e prolongamento dessa linha que ligaria, o Jacarecanga ao Matadouro (Otávio Bonfim).

 

Casa da Sra Isaura viúva do Primeiro Mestre de Linha

 

 

A Rede de Viação Cearense – RVC construiu uma casa na beira da linha, onde um Mestre de Linha era responsável por estas manobras, destinando os trens das linhas Norte e Sul. Não conseguimos o nome desse trabalhador da ferrovia, mas chegamos a conhecer a Sra. Isaura (velha Isaura) viúva do ferroviário. Agora espero ter desvendados para os amigos, o porquê daquela casa no meio, como divisória das Avenidinhas das castanholas.

 

 

 

 

 

Olhem o Quanto o Trem Cortava o Meu Jacarecanga!

 

 

A estação de Otávio Bonfim fora inaugurada em dezembro de 1922, mas devido o nome do Bairro ainda fora chamada de Matadouro.

Então começou o movimento ferroviário no Jacarecanga, e a Rede de Viação Cearense construiu uma Vila Operária sob a responsabilidade de Jacinto de Matos, em terreno hoje localizado defronte ao Centro de Saúde Carlos Ribeiro. Esse exemplo fora seguido por a firma José Pinto do Carmo, que em 1928 era Fábrica Baturité. Nascia a Vila São Pedro. Entendem meninada do meu tempo, por que o trem no triângulo passava cheirando as portas da casa do Gutemberg?

 

 

Reprodução do Álbum de Fortaleza – 1931.

Avenida Demosthenes Rockert 5 de Julho

Atual Francisco Sá

 

Foi assim que começou o movimento sobre trilhos no meu Jacarecanga. Com toda essa efervescência do trem como um potencial na economia, surgiu a Casa Machado, Usina São Judas Thadeu (óleo Paturi); lá mais adiante em rumo a Floresta o trem passou a atender a Brasil Oiticica e a Cia Ceará Têxtil; pela linha Sul a Siqueira Gurgel.

Ah! Jacarecanga fora contemplado pelo trem suburbano de Maracanaú, fazendo paradas na Avenida Francisco Sá, pois, até 1980 os moradores iam de trem para o Centro às 6.15 h e 13.15 h, retornando as 11.15 e às 18.30. À noite o trem prosseguia até ao hoje Município de Acarape.

 Pois bem, as linhas Norte e Sul faziam convergência na Estação Central e, no Jacarecanga como linha divisória, formou-se um triângulo, aonde trens cargueiros vindos de Otávio Bonfim para Álvaro Weyne entravam, no mesmo; serviu esse triângulo para as reversões de locomotivas e composições de passageiros. Eu cheguei a ser Buchecheiros junto com a meninada, como se diz: Pegávamos Bigus.

Mas, tudo o que é bom passa. As fábricas inexistem, e com a chegada do Metrô de Fortaleza, desde 2010 que o trem fora arrancado do Jacarecanga.

A Vila São José fica só a contemplar de modo amistoso, a passagem do Veiculo Leve Sobre Trilhos – VLT na linha Oeste, que nem se quer olha para minha Vila. Possa ser à posteriori.

O trem chorando por força do Metrô, abandonou a área e nunca mais passou….

 

 

 

 

Fontes:

  •  Álbum de Fortaleza, Paulo Bezerra, 1931.
  • O Ceará Que Entrou nos Trilhos, Francisco de Assis Silva de Lima, Gráfica Visual , 2015
  • História da Vila São José, O Jacarecanga que Eu Vivi, Idem, Gráfica Visual, 2019.

QUE EXISTIA DE ELEGANTE NAQUELE CAFÉ

 

Panorâmica do Café Elegante

 

Fortaleza na virada do século XX, estava sendo administrada pelo intendente Guilherme Rocha, embora uma gestão nocauteada por Antônio Pinto Nogueira Accioly, que já vinha liderando desde 1892.

 

Intendente Guilherme Rocha

 

Em julho de 1900 assume o Governo do Ceará Pedro Augusto Borges, mas a gestão municipal do intendente iria até 1912. Pedro Borges manteve sua administração subserviente à Oligarquia Acciolyna.

 

Jardim 7 de Setembro – 1902

 

Em 1902, concomitantemente com a segunda greve dos operários da Estrada de Ferro de Baturité, o Centro de Fortaleza estava recebendo nos festejos dos 80 anos de nossa independência, o Jardim “7 de setembro” aformoseando a Praça do Ferreira, onde houve um remodelação e, foi quando aumentou ainda mais os frequentadores daquele logradouro, aquecendo a venda de lanches e refeições completas nos quiosques existentes.

No “Café Java” (canto Nordeste) muito bate papo de intelectuais, e foi a bem da história, onde Antônio Sales fez o protocolo de intensões para fundar o grêmio literário que se denominaria “Padaria Espiritual”, que em 1902 já não mais existindo, tornou-se um point das conversas sobre literatura e política afora o anedotário.

Do “Café do Comércio” (Canto Noroeste) partia os bondes que na época ainda era “Ferro Carril”, cuja administração era vizinho do lado leste, olhando para o quarteirão que desapareceria em 1941.

O “Café Iracema” (Canto Sudoeste), olhava para a calçada da Rua Major Facundo, que se denominava Rua da Palma e onde seria construídos os três grandes Cines: Cine Theatro Polytheama (1911), Majestic (1917) e o Moderno (1922). O Café Iracema ficava olhando para a casa onde ficava a Botica de Antônio Ferreira, o filantropo. Os quiosques ainda alcançaram os frequentadores do Cine Theatro Polytheama e o Mejestic, porém o Moderno, primeiro a ser sonorizado, não fora possível. Em 1920 desapareceram, e o leitor saberá.

Cajueiro da Mentira e por detrás o Elegante – 1905

 

Porquê Café Elegante

Pela sua posição geográfica, respirava calma, apesar de ser o mais próximo do Cajueiro da Mentira, onde rolava potocas. Por sua frente era a Rua Floriano Peixoto (Pitombeira) e ao lado sul, transitava na Rua do Cajueiro (Pedro Borges) os bondes, mas sem parar. Lá no final da Rua Pedro Borges, descendo em rumo leste encontrava-se o Beco dos Pocinhos, onde para localização de hoje, em 1970 construíram o Edifício Palácio do Progresso. Naquele espaço já existia a Igreja Presbiteriana de Fortaleza, que data de 1896.

Voltando.

No Elegante existia uma calmaria, e com ar mais puro, afinal, pela rua que ficava na esquina vinha o vento leste, trazendo a gostosa brisa do Riacho Pajeú e da lagoa do Garrote onde ainda existia águas bem límpidas.  A umidade relativa do ar era melhor.

No ângulo Sudeste, o quiosque ficava defronte à Funilaria São José, torrefação de Joaquim Sá e no American Kinema. Seus proprietário foi Arnaud Cavalcanti Rocha, e no seu início chamava Café Chic.  Já com o nome de Café Elegante foi passado para a firma Porto & Irmão. O Café Elegante, tinha a mesma estrutura do Café do Comércio: um segundo pavimento.

 

Vista Lateral do Café Elegante

 

Andar pelo Elegante, era fazer suas refeições com mais tranquilidade, e o público segundo eruditos, era mais seleto. Até os fiéis das Igrejas Presbiteriana e do Rosário, após as reuniões, ali paravam.

Em 1920 Godofredo Maciel estava Prefeito de Fortaleza, e foi quando ocorreu um nova reforma da Praça e os Quiosques foram retirados, e junto com eles foi derrubado o Cajueiro Botador e destruído o Jardim 7 de setembro. Adeus “Casas de Merendas”.

Com esta remodelação, a Praça do Ferreira perdeu atrativos, e os fregueses por amor à Praça, se dirigiram para os Cafés Emidgio e Riche, só para não abandonar o recinto.

Existia uma cacimba que servia para o trabalho dos jardineiros, mas que fora coberta com um Coreto, ao qual por sua vez em 1933 com a Primeira Coluna da Hora.

Comete injustiça com a história, quem proclama que a Praça do Ferreira a partir de 1991 ficou elegante. Uma geração que viu o Monstrengo na desastrosa “Gestão José Walter” pode até ter razão, mas muita coisa Elegante ficou pra trás.

 

 

Fontes:

 

A Praça do Ferreira, Juarez Leitão;

Fortaleza de Ontem e de Hoje, Miguel Ângelo de Azevedo, Nirez;

Fortaleza Velha, João Nogueira.

História Abreviada de Fortaleza, Mozart Soriano Aderaldo.

Fotos: Reproduzidas de Originais pertencentes ao Arquivo Nirez, gentilmente cedidas.

 

PADARIA ESPIRITUAL PRECURSORA DAS ACADEMIAS

 

 

 

 Café Java, no canto Nordeste da Praça do Ferreira

Nasceu a Padaria Espiritual

 

Fortaleza, final do Século XIX.

Durante seis anos, uma sociedade de “rapazes de Letras e Artes” daria o que falar. Bem-humorados, ousados, sobretudo talentosos, os membros da PADARIA ESPIRITUAL protagonizaram, no antagônico recém criado Estado, um movimento literário modernista que antecedeu em muitos anos a Semana de Arte Moderna e seria um destaque histórico, fomentando os que estudam a Literatura Brasileira. Escasso são os relatos sobre o que foi a Padaria, como atuavam os padeiros, quais eram seus postulados e como os traduziam no O Pão, jornalzinho de oito páginas, que circularia até o nº 36, deixando um rastro de irreverência notória.

 

 

Os “padeiros” assinavam seus textos com pseudônimos, o que geralmente chocava as pessoas, pois muitos dos pseudônimos remetiam a elementos nacionais e/ou regionais, uma forma de criticar o academicismo presente nas associações literárias de até então.

 

Poeta Antonio Sales

 

 

Antônio Sales, considerado o idealizador da Padaria Espiritual, foi Moacir Jurema, Adolfo Caminha foi Félix Guanabarino, Jovino Guedes foi Venceslau Tupiniquim, Lívio Barreto foi Lucas Bizarro, entre outros “rapazes de letras e artes”, isto é, integrantes da Padaria Espiritual que adotaram pseudônimos considerados ousados, naquele contexto.

Um dos principais objetivos do grupo era promover o gosto pela literatura na sociedade, isto é, estabelecer uma sociedade literária (renovada, original) em seu tempo, considerando a apatia literária da sociedade cearense da época.

 

 

 

O escritor Antônio Sales, ao redigir o Programa de Instalação da Padaria Espiritual, espécie de estatuto, composto de 48 itens, acerca das premissas e propostas da padaria, foi responsável pela construção de uma estrutura para ”legitimar” o movimento.

O estatuto foi lido pela primeira vez na inauguração da agremiação literária, no dia 30 de maio de 1892, no Café Java, na Praça do Ferreira, em Fortaleza.

 

 

 

A Padaria Espiritual foi uma das mais singulares agremiações culturais tanto do Ceará como do Brasil. Por ela passaram escritores que ajudaram a compor parte significativa da atividade artística e da imprensa na província cearense. O intuito de seus idealizadores era despertar, na sociedade, o gosto pela arte.

Como já havia precedentes de sociedades artísticas, muitas delas de caráter formal e retórico, decidiram produzir algo original e até mesmo escandaloso, que repercutisse no gosto do povo. Antônio Sales redigiu seu programa de instalação e foi um dos principais responsáveis pela publicação do jornal da agremiação, O Pão. A Padaria Espiritual não era uma sociedade exclusivamente das Letras, mas das artes em geral, pois o grêmio contou tanto com prosadores e poetas, quanto com pintores, desenhistas e músicos.

 

 

Diferente mocidade Cearense comprometida com os interesses econômicos dos emergentes setores urbanos e de estreita ligação com as tradicionais oligarquias rurais, o grupo dos padeiros, oriundo dos Novos do Ceará diferente do arsenal teórico científico pautado nas ideias positivas e evolutivas iria propor um novo projeto literário baseado nos valores e hábitos do
“tipo” campestre, heroico e valente. O movimento literário e artístico dos artistas padeiros
seria uma “cousa nova”, fugindo, pois, das formalidades científicas e bacharelescas dos tantos
outros movimentos acontecidos anteriormente. De forte caráter boêmio e pilhérica o movimento dos padeiros causou “escândalo” numa pacata e provinciana Fortaleza de então, acostumada à seca, à pilheria e ao aluá.

Manuel Coco proprietário do Café Java, lamentou e muito vendo Fortaleza entrar no século XX, ficando para trás, dois anos a Padaria Espiritual.

Funcionamento da Padaria:

“Um Padeiro Mor”; “Dois Forneiros”; “Um Gaveta”; “Um Guarda Livros”; “Um Investigador”; e os demais eram “Amassadores”. A sede da Padaria era chamada de Forno e a cada reunião era chamada de “Fornada”.

 

 

 

ESTATUTO DA PADARIA ESPIRITUAL

            Eis os Estatuto da Padaria Espiritual, movimento pioneiro no Ceará — terra de José de Alencar — e precursor das academias de letras em terras brasileiras. Movimento modernista, ainda hoje atual, com 40 anos de antecedência à Semana de Arte de 1922.

1) Fica organizada, nesta cidade de Fortaleza, capital da “Terra da Luz”, antigo Siará Grande, uma sociedade de rapazes de Letras e Artes, denominada Padaria Espiritual, cujo fim é fornecer pão de espírito aos sócios em particular, e aos povos, em geral.

 

2) A Padaria Espiritual se comporá de um Padeiro-Mór (presidente), de dois Forneiros (secretários), de um Gaveta (tesoureiro), de um Guarda-livros na acepção intrínseca da palavra (bibliotecário), de um Investigador das Coisas e das Gentes, que se chamará Olho da Providência, e demais Amassadores (sócios). Todos os sócios terão a denominação geral de Padeiros.

 

3) Fica limitado em vinte o número de sócios, inclusive a Diretoria, podendo-se, porém, admitir sócios honorários que se denominarão Padeiros-livres.

 

4) Depois da instalação da Padaria, só será admitido quem exibir uma peça literária ou qualquer outro trabalho artístico que for julgado decente pela maioria.

 

5) Haverá um livro especial para registrar-se o nome comum e o nome de guerra da cada Padeiro, sua naturalidade, estado, filiação e profissão a fim de poupar-se à Posteridade o trabalho dessas indagações.

 

6) Todos os Padeiros terão um nome de guerra único, pelo qual serão tratados e do qual poderão usar no exercício de suas árduas e humanitárias funções.

 

7) O distintivo da Padaria Espiritual será uma haste de trigo cruzada de uma pena, distintivo que será gravado na respectiva bandeira, que terá as cores nacionais.

 

8) As fornadas (sessões) se realizarão diariamente, à noite, à excepção das quintas-feiras, e aos domingos, ao meio-dia.

 

9) Durante as fornadas, os Padeiros farão a leitura de produções originais e inéditas, de quaisquer peças literárias que encontrarem na imprensa nacional ou estrangeira e falarão sobre as obras que lerem.

 

10) Far-se-ão dissertações biográficas acerca de sábios, poetas, artistas e literatos, a começar pelos nacionais, para o que se organizará uma lista, na qual serão designados, com a precisa antecedência, o dissertador e a vítima. Também se farão dissertações sobre datas nacionais ou estrangeiras.

 

11) Essas dissertações serão feitas em palestras, sendo proibido o tom oratório, sob pena de vaia.

 

12) Haverá um livro em que se registrará o resultado das fornadas com o maior laconismo possível, assinando todos os Padeiros presentes.

 

13) As despesas necessárias serão feitas mediante finta passada pelo Gaveta, que apresentará conta do dinheiro recebido e despendido.

 

14) E proibido o uso de palavras estranhas à língua vernácula, sendo, porém, permitido o emprego dos neologismos do Dr. Castro Lopes.

 

15) Os Padeiros serão obrigados a comparecer à fornada, de flor à lapela, qualquer que seja a flor, com excepção da de chichá.

 

16) Aquele que durante uma sessão não disser uma pilhéria de espírito, pelo menos, fica obrigado a pagar no sábado café para todos os colegas. Quem disser uma pilhéria superiormente fina, pode ser dispensado da multa da semana seguinte.

 

17) O Padeiro que for pegado em flagrante delito de plagio, falado ou escrito, pagará café e charutos para todos os colegas.

 

18) Todos os Padeiros serão obrigados a defender seus colegas da agressão de qualquer cidadão ignáro e a trabalhar, com todas as forças, pelo bem estar mútuo.

19) É proibido fazer qualquer referência à rosa de Maiherbe e escrever nas folhas mais ou menos perfumadas dos álbuns.

 

20) Durante as fornadas, é permitido ter o chapéu na cabeça, exceto quando se falar em Homero, Shakespeare, Dante, Hugo, Goethe, Camões e José de Alencar porque, então, todos se descobrirão.

 

21) Será julgada indigna de publicidade qualquer peça literária em que se falar de animais ou plantas estranhos à Fauna e à Flora brasileiras, como: cotovia, olmeiro, rouxinol, carvalho etc.

 

22) Será dada a alcunha de “medonho” a todo sujeito que atentar publicamente contra o bom senso e o bom gosto artísticos.

 

23) Será preferível que os poetas da “Padaria” externem suas idéias em versos.

 

24) Trabalhar-se-á por organizar uma biblioteca, empregando-se para isso todos os meios lícitos e ilícitos.

 

25) Dirigir-se-á um apelo a todos os jornais do mundo, solicitando a remessa dos mesmos à biblioteca da “Padaria”.

 

26) São considerados, desde já, inimigos naturais dos Padeiros – o Clero, os alfaiates e a polícia. Nenhum Padeiro deve perder ocasião de patentear seu desagrado a essa gente.

 

27) Será registrado o fato de aparecer algum Padeiro com colarinho de nitidez e alvura contestáveis.

  28) Será punido com expulsão imediata e sem apelo o Padeiro que recitar ao piano.

 

29) Organizar-se-á um calendário com os nomes de todos os grandes homens mortos, Haverá uma pedra para se escrever o nome do Santo do dia, nome que também será escrito na Ata, em seguida à data respectiva. 30) A “Avenida Caio Prado” é considerada a mais útil e a mais civilizada das instituições que felizmente nos regem, e, por isso, ficará sob o patrocínio da Padaria,

 

31) Encarregar-se-á um dos Padeiros de escrever uma monografia a respeito do incansável educador Professor Sobreira e suas obras.

 

32) A “Padaria” representará ao Governo do Estado contra o atual horário da Biblioteca Pública e indicará um outro mais consoante às necessidades dos famintos de idéias.

 

33) Nomear-se-ão comissões para apresentarem relatórios sobre os estabelecimentos de instrução pública e particular da Capital relatórios que serão publicados,

 

34) A Padaria Espiritual obriga-se a organizar, dentro do mais breve prazo possível, um Cancioneiro Popular, genuinamente cearense.

 

35) Logo que estejam montados todos os maquinismos, a Padaria publicará um jornal que, naturalmente, se chamará O Pão.

 

36) A Padaria tratará de angariar documentos para um livro contendo as aventuras do célebre e extraordinário Padre Verdeixa.

 

37) Publicar-se-á , no começo de cada ano, um almanaque ilustrado do Ceará contendo indicações uteis e inúteis, primores literários e anúncios de bacalhau.

 

38) A Padaria terá correspondentes em todas as capitais dos países civilizados, escolhendo-se para isso literatos de primeira água.

 

39) As mulheres, como entes frágeis que são, merecerão todo o nosso apoio excetuadas: as fumistas, as freiras e as professoras ignorantes.

 

40) A Padaria desejaria muito criar aulas noturnas para a infância desvalida; mas, como não tem tempo para isso, trabalhará por tornar obrigatório a instrução pública primada.

 

41) A Padaria declara desde já guerra de morte ao bendegó do “Cassino”.

 

42) É expressamente proibido aos Padeiros receberem cartões de troco dos que atualmente se emitem nesta Capital.

 

43) No aniversário natalício dos Padeiros, ser-lhes-á oferecida uma refeição pelos colegas.

 

44) A Padaria declara embirrar solenemente com a secção “Para matar o tempo” do jornal “A Republica”, e, assim, se dirigirá à redação desse jornal, pedindo para acabar com a mesma secção.

 

45) Empregar-se-ão todos os meios de compelir Mané Coco a terminar o serviço da “Avenida Ferreira”.

 

46) O Padeiro que, por infelicidade, tiver um vizinho que aprenda clarineta, pistom ou qualquer outro instrumento irritante, dará parte à Padaria que trabalhará para pôr termo a semelhante suplício.

 

47) Pugnar-se-á pelo aformoseamento do Parque da Liberdade, e pela boa conservação da cidade, em geral.

 

48) Independente das disposições contidas nos artigos precedentes, a Padaria tomará a iniciativa de qualquer questão emergente que entenda com a Arte, com o bom Gosto, com o Progresso e com a Dignidade Humana.

 

Amassado e assado na “Padaria Espiritual”, aos 30 de Maio de 1892.

 

Seguem-se as assinaturas dos padeiros presentes, em número de dezoito, faltando, portanto, duas assinaturas.

Fontes:

A Padaria Espiritual e o Simbolismo no Ceará – Sânzio de Azevedo, 1983;

Os Padeiros e Seu Periódico, edição fac-similar do O Pão, publicada em coedição pelas Edições UFC e ACL.

O OPERÁRIO, 1892 Dr. Castro Lopes

Presença da Padaria Espiritual na História da Imprensa e das Artes no Ceará – Luciana Brito

Fotos: Os registros iconográficos foram reproduzidos de originais pertencentes ao Arquivo Nirez, gentilmente cedidos.

DO CHICO LAMPIÃO À UMA CIDADE QUE SE ILUMINOU

 

 

O homem tem a tarefa de acender o lampião de noite e apagá-lo de dia, mas o planeta gira muito rápido e o Sol se põe a cada minuto, o que faz com que o seu trabalho seja cansativo. O Acendedor de Lampiões simboliza as pessoas que cumprem determinadas tarefas sem pensamento crítico, muitas vezes fazendo coisas sem sentido ou sem entender porquê. Elas ligam o piloto automático, estão tão acostumadas com o que fazem, que não se dão conta da importância do que faz”.          José Augusto Wanderley, Publicitário. RJ.

Tudo o que é relacionado ao desenvolvimento, obedece a etapas ou estágios. Ao retornarmos historicamente ao passado, não implica em se sofrer atrasos, mas estamos resgatando merecimentos, afinal o moderno hoje é o antigo amanhã. O moderno carro de injeção eletrônica não chegou antes daqueles, cuja partida era à manivela com carburação falha; o compacto celular em que localizamos as pessoas apenas no tempo, não podia chegar primeiro do que os aparelhos de telefonia ao magneto, com sua extensão entre emissor e receptor não superior a 1000 metros; as aeronaves, os super-sônicos dar uma volta ao mundo em questão de horas, porém, Alberto santos Dumont penou bastante para fazer subir o 14 BIS em 1906 na França, com um metro de altitude e descer com apenas cem metros percorridos.

Será que a iluminação e energia elétrica foram diferentes? Claro que não! Fortaleza foi saindo da escuridão a custa do sacrifício de animais marinho, hoje na lista de extinção. (Vide Praia dos Arpoadores). No caso Refiro-me as baleias que desapareceram da Costa Norte. Sim, pois a iluminação pública de nossa cidade, tinha como combustível, o azeite de peixe, cujos estudos datam de 25 de janeiro de 1834, mas que só foram concretizados em março de 1848, quando já era Presidente da Província Cearense, Casimiro José de Moraes Sarmento.

 

 

Luminária do Café Caio Prado

Passeio Público

 

A exploração do serviço de iluminação de Fortaleza teve inicio, com a assinatura de um contrato com o Sr. Vitoriano Augusto Borges que tinha como atribuição, instalar 44 lampiões. Os lampiões tinham quatro faces, sendo mais estreitas em baixo do que em cima, com fundo e tampa de metal. Eram suspensos com armações de ferro como se fosse uma forca, afixados nas esquinas e na posição que pudessem iluminar ruas e travessas. Eram limpos constantemente, e para acendê-los deveriam descer, por isso eles pendiam de uma corda, que passava em duas roldanas. Tinha uma caixinha cheia de azeite de peixe com torcida de algodão. Era parecido com pequenos tachos de que trabalham os ourives para soldas ao maçarico. Foi assim que surgiu o primeiro personagem popular de Fortaleza: “Chico Lampião”, embora seu nome conste em algumas obras, mas nada se sabe acerca do mesmo, assim como os carregadores de Quimoas.

 Fortaleza bonitinha ficou sendo iluminada com azeite de Peixe até 1866 quando, o português Vitorino Borges encerrou suas atividades nesta prestação de serviço. Surgiu a era do Gás Carbônico sob a responsabilidade da “The Ceará Gaz Company Limited”.

 

Gasômetro ao lado da Santa da Casa.

 

Com o gás carbônico, as ruas de nossa cidade tiveram melhor qualidade na iluminação, pois as luminárias foram colocadas em ziguezague sendo a distância de um para o outro de apenas 30 metros, e com um atura de 2,40 cm. Ficava uma chama brilhante em forma de leque queimando o bem preparado gás, salientando que o gasômetro ficava na rua Senador Jaguaribe, ao lado da Santa Casa de Misericórdia olhando para a Praça do Passeio Público. Daí o antigo nome daquela denominar-se “Rua do Gasômetro”.

Experimentalmente, em 1933 foram colocadas quatro lâmpadas elétricas de 100 Watts na Rua Formosa (Barão do Rio Branco), entre as Ruas da Municipalidade (Guilherme Rocha) e a das Hortas (Senador Alencar).

Em 1934, fora rescindido o contrato da “Companhia Ceará Gás” e o Governo do Estado do Ceará, naquele mesmo ano oficialmente, inaugurou-se na praça do Ferreira a energia elétrica, aos 8 de dezembro, o que fora uma apoteose.

Um ano após, fora retirado o último lampião à gás encerrando assim, o segundo período da iluminação de Fortaleza, a era do Gás Carbônico.

Novo Privilégio para a The Ceará Tramway Light & Power Co. Ltd

 Descida da Rua Formosa (Barão do Rio Branco)

Cabos da Light

 

A firma inglesa “The Ceará Tramway Light & Power Co. Ltd” que já explorava o transporte de bondes elétricos desde de 1913, ganhou agora privilégio para o serviço de iluminação. A localização dos geradores da Light eram na Rua Adolfo Caminha (Baixos do Passeio Público) e as suas caldeiras eram alimentadas com lenhas vindas do Horto Florestal de Canafístula, trazidas em vagões gôndolas pertencentes a Companhia Cearense da Via Férrea de Baturité.

 

Bonde Elétrico do Outeiro na Rua Floriano Peixoto

 

Aos 19 de maio de 1947 circulou o último bonde elétrico em Fortaleza e, apesar da sobra de demanda, a energia da Light ainda era muito precária. A “The Ceará Tramway”, por força do decreto federal nº 25.232 de 15 de julho de 1948 transferida a concessão para a Prefeitura Municipal de Fortaleza, sendo o Prefeito Acrisio Moreira da Rocha. Na época tinha que o General Dutra assinar, por ter sido o serviço explorado por uma firma estrangeira.

Carregamento de Lenhas

Vindas de Canafistula hoje Antônio Diogo

 

Aos 20 de maio de 1954, saiu o decreto nº 803 criando o “Serviço de Luz e Força do Município de Fortaleza – SERVILUZ” quando ainda estava prefeito, o radialista e advogado Paulo Cabral de Araújo. As novas instalações foram inauguradas em 8 de novembro do mesmo 54, ocupando o local onde funcionava o Escritório da extinta empresa de Bondes no Passeio Público, pela Rua João Moreira.

Usina Serviluz no Mucuripe

Fachada, Localização e Maquinas geradoras.

 

A Usina Termoelétrica fora instalada em maio de 1955 na Ponta do Mucuripe, inicio da Praia Mansa. Com modernos geradores Westinghouse, o Serviluz fora criado para resolver o problema da precária energia elétrica de Fortaleza.

As razões técnicas para a usina ficar distante do centro da cidade, segundo analistas da época, deveram-se a estratégica zona portuária com o surgimento de empreendimentos, tais como os já existentes: Shell Mexi, Atlantic, Texaco, Esso Standard do Brasil e Moinhos de trigo. Além do mais, o equipamento roncava e aquecia demais e a ventilação praiana, favorecia a regulagem térmica.

O Serviluz foi administrativamente transferido em 1 de maio de 1960 para a Companhia Hidroelétrica do São Francisco – CHESF (Estado da Bahia), a qual por sua vez, em 1 de abril de 1962 instala a Companhia Nordeste de Eletrificação de Fortaleza – CONEFOR que substituiu o Serviluz. Dois anos após, a rede elétrica proveniente da Usina Hidroelétrica de Paulo Afonso chegou em Fortaleza, com uma subestação no Bairro Mondubim.

 Aí com as presenças do Presidente da República, Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco, do Governador do Ceará Virgílio Távora, do Prefeito de Fortaleza Murilo Borges e várias autoridades, em 1 de fevereiro de 1965 precisamente às 18.30 h, na Praça Libertadores (Depois Farias Brito) no popular Bairro Otávio Bonfim, era acessa a primeira lâmpada de iluminação pública com energia elétrica da CHESF.

Em 5 de julho de 1971, o Governo César Cal’s cria a Companhia de Eletricidade do Ceará – COELCE e encampa a Conefor, que após três anos em assembleia geral, a extingue.

Como não era de se esperar, a história se repetiu. O comando do serviço de energia elétrica do Ceará saiu das mãos do Governo Estadual. A Coelce foi vendida, e aos 13 de maio de 1998, passou a pertencer a “Distriluz Energia Elétrica S.A.”, “Companhias Enersis S.A.”, “Chilectra S.A.”, “Endesa de España S.A.” e a “Companhia de Eletricidade do Rio de Janeiro – CERJ”.

Então quem quiser deixar seu dinheiro no Brasil, consuma produtos da Terra e economize energia. Seja racional, pois, não existe mais Coelce e sim Enel.

 

Fontes:

– Fortaleza Belle Époque, Sebastião Rogério Ponte;

– Fortaleza de Ontem e de Hoje, Miguel Ângelo de Azevedo – Nirez.

– Fortaleza Velha, João Nogueira;

– Instituto do Ceará, Revista de 1934;

– História da Energia Elétrica do Ceará, Ary Leite.

Fotos: Ofipro e uma reprodução de originais pertencentes ao Arquivo Nirez, gentilmente cedidas. .