Assis Lima
Assis Lima

A PADARIA DO PORTUGUÊS AUGUSTO PINHO

Vista Interna da Padaria

Da esquerda para a direita: Pau Branco, Risonho,

Bacana (ainda magro), Josué, Ribamar, Tarzan e seu Augusto de terno.

 

 

Numa calçada larga, em forma triangular e defronte ao Guaratinguetá (Bar do seu Telles), no início da rua Dona Maroquinha, ficava uma montanha de lenhas. Era para alimentação térmica, dos fornos da Panificadora Popular, cujos serviços iam noite adentro.

No lado Sul do prédio com dois andares e de 40 metros de fachada, havia uma estreita calçada onde chumbaram anéis de ferro trefilado de 5/8 de polegada no cimento armado. Designavam-se aquelas peças, para amarração dos animais que serviam como transporte dos rústicos caixotes, que iriam ser carregados com pães novinhos e crocantes.

Naquela época o pão bengala era à semolina. Esse tinha outro sabor devido sua composição química diferenciada.

Os clientes eram as mercearias como ainda posso lembrar: bodega do Edmilson, do Luís Carvalho (ambas na Avenida Tenente Lisboa); Abelardo da Vila São Pedro, Seu Arteiro do mercadinho da Via Férrea e seu Hozanan Arruda; saíam também mercadorias para o Morro do Ouro, Cercado José Padre e João Lopes, que depois de urbanizado pegou o nome de Monte castelo. (Não existiam os Bairros Santa Maria nem Ellery. Tudo era João Lopes). Lá se vai a gente querendo escrever outra coisa…….

O cavalo que levava a mercadoria do Seu Josué (vendedor ambulante) saía da calçadinha, abarrocado com o pão nosso de cada dia. Carioquinha é coisa dos anos oitenta, quando também fizeram com o pão sovado, muito aproveitado para o Hot Dog. Conservantes industrializados é que lascam nossa saúde.

As fábricas São José, José Pinto do Carmo, Casa Machado além da Padaria Triunfo na rua Liberato Barroso, todos esses empreendimentos eram abastecidos pela Panificadora de Augusto Pinho, que se estabeleceu na Vila São José em 1961.

Rapazinho robusto, ainda carreguei caixotes na cabeça com até um cento de pão para a Fábrica de tecidos do bairro. O porteiro da usina era o Pinheiro “Cabeça Branca”; o seu Nogueira “Simpatia” era o responsável pelo restaurante. Os infanto-juvenis nunca saíam da fábrica São José, sem lanchar. Quantas vezes havia disputa para quem ia fazer a entrega. Só coisa de menino: trabalhar pela comida.

Na panificadora Popular, era caixa e despachante um personagem baixo e gordo chamado de “Bacana”. Lá dentro literalmente com mãos na massa e, outras na lenha tínhamos: o Riba, o Maranguape, Pau Branco, Caladinho e o Tarzan.

Foi uma convivência de doze anos e ninguém sabia nome de ninguém. Recebi dois batismos: “Pirulito Americano”, e “Pai da Mata” porque meu cabelo era crescido. Rotulou e pegou! Ê, molecagem!!

Intenso era o movimento na calçada da panificadora do português, e uma chaminé bufando fumaça preta, poluía a avenidinha Sul, e às vezes inquietava os animais ali amarrados, mas a espera era pouca.

À noite na calçada quando livre, a meninada aproveitava para lazer. Brincadeira do buldogue, onde duas equipes se confrontavam corporalmente e quem conseguisse levantar o outro, era eliminado. E a corrida de mijo, valha meu Deus! Não posso descrever….

Na época do milho verde, pessoas não se sabem de onde, vinham acender fogareiros para vender: cozidos e assados. No outro dia muitas vezes seu Augusto se irritava por haver ficado palha defronte do seu estabelecimento.

Aos sábados pela tardinha também na calçada da padaria, a professora Francisca, do Grupo Marcílio Dias, ministrava o Catecismo para os que iam fazer primeira comunhão, cujo evento ocorria na Igreja dos Navegantes, quase defronte a Escola de Aprendizes Marinheiros, cerimônia regida por o Padre Mirton Lavor. O Frei Memória realizava o confessionário tudo com o aval do Monsenhor Hélio Campos.

Deste modo escrevemos com o sentimento renascente, cada instante rememorado. Que não nos desviemos das lembranças de quem fomos, e ainda somos.

Em 1972, seu augusto abandonou o lugar; entregou o prédio ao Pedro Philomeno, retirando sua panificadora. Lá tínhamos pão comum, pão recife, de coco, bolachas, laticínios e afins.

O lugar degringolou.

O espanhol Raul Magno e Dona Madelú chegou a alugar o prédio para sua indústria de calçados, mas não vingou.

Hoje a calçada não mais existe. O prédio com estética invejável passou a ser um fracionado monstrengo, com uma adaptação não planejada para residências.

Ficou no lendário o movimento da Padaria, lazer e eventos que ali foram realizados. Desde as brincadeiras, movimentos religiosos até o lançamento das candidaturas do doutor Dorian Sampaio para Deputado Estadual, e Valdemar Alves de Lima (meu Pai) para a Câmara Municipal de Fortaleza. Eu já escrevi o episódio deste par[agrafo.

São lembranças que com a mutilação topográfica, ainda ficam para os que cultuam o passado.

Não é fácil passear pelo ontem, garimpando fatos.

Ai está o que restou do Prédio da Padaria.

Até nosso calçadão reduto de lazer noturno, desapareceu….

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