Assis Lima
Assis Lima

O JACARECANGA E O TREM

 

Entrada da Vila São José.

Via estreita entre os Trilhos e o Muro da Fábrica.

 

A cogitação do Jacarecanga ser contemplado pela ferrovia, se deu ao fato da já existente Companhia da Via Férrea de Baturité, empresa que havia sido criada em 1870. O trem que já circulava por o Centro da cidade pela Rua Trilho de Ferro (Tristão Gonçalves) rumo ao Sul do Estado, desde 30 de novembro de 1873 deveria ser estendido seu trajeto, para região Norte do Ceará.

Houve vários estudos sobre o ponto inicial para a construção de um novo trajeto da ferrovia cearense, agora no sentido Oeste. Relatórios que a empresa ferroviária enviava para o Ministério da Viação e Obras Públicas dão conta de que, no primeiro quartel do século XX a saída Oeste em rumo ao Norte do Estado, seriam Parangaba, Mondubim ou a própria Estação Central.

Prevaleceu a Central, quando foram retirados milhões de metros cúbicos de areia, o que mutilou o Morro do Moinho e o do Croatá, sendo assentado os primeiros trilhos em janeiro de 1916. Foi construída uma ponte metálica para que fosse transpassado o Riacho Jacarecanga, e o trem seguiria em rumo ao Bairro Floresta. Nas construções e prolongamentos, as estações de Antônio Bezerra e Caucaia foram inauguradas em 1917; e posteriormente em 1926 a da Floresta, hoje Álvaro Wayne. Vide no Livro “O Ceará que Entrou nos Trilhos” de nossa a autoria.

                              Álbum da RVC

Ponte Ferroviária do Jacarecanga em 1918

O trem trazendo cargas de Caucaia e Antônio Bezerra

 

 A ponte ferroviária passou pela primeira reforma em 1919. Obedecendo a um plano de mobilidade urbana e precavendo erradicação de acidentes no Centro de Fortaleza, o engenheiro Henrique Eduardo Couto Fernandes conseguiu aprovação e o Ministério da Viação e Obras Públicas autorizou para que, os trilhos seguissem em sentido Oeste, e passassem numa curva à 90º por detrás da propriedade dos Philomeno Gomes.   O Aparelho de Mudança de Via – AMV fora colocado a 150 metros após a transpassagem sobre a ponte do riacho Jacarecanga, devendo os maquinistas fazerem parada obrigatória no local do aparelho. A partir de 1920 a RVC começou a construção e prolongamento da linha que ligaria, o Jacarecanga ao Matadouro (Otávio Bonfim).

A Rede de Viação Cearense – RVC construiu uma casa na beira da linha, onde um Mestre de Linha era responsável por estas manobras, destinando os trens das linhas Norte e Sul. Não conseguimos o nome desse trabalhador da ferrovia, mas chegamos a conhecer a Sra. Isaura (velha Isaura) viúva do ferroviário. Agora espero ter desvendados para os amigos as Vila São José, o porquê daquela casa no meio, como divisória para as avenidinhas das castanholas.

A estação de Otávio Bonfim fora inaugurada em 31 dezembro de 1922, mas devido o nome do Bairro, ainda fora chamada de Matadouro até 1926.

                                  Álbum da RVC

Ponte Ferroviária sobre o Riacho Jacarecanga. 1917.

Ela fora alterada em 1920 como leremos. 

 

                   Reprodução

Casa da Velha Isaura.

 

 Observemos do alto este registro de 1928.

 

Então começou o movimento ferroviário no Jacarecanga, e a Rede de Viação Cearense construiu uma Vila Operária sob a responsabilidade de Jacinto de Matos, em terreno hoje localizado defronte ao Centro de Saúde Carlos Ribeiro. Esse exemplo fora seguido por a firma José Pinto do Carmo, que em 1928 era Fábrica Baturité. Nascia a Vila São Pedro. Entendem meninada do meu tempo, por que o trem no triângulo passava cheirando as portas da casa do Gutemberg?

 

Reprodução do Álbum de Fortaleza – 1931.

Em seu lugar fora construída a José Pinto do Carmo

Foi assim que começou o movimento sobre trilhos no meu Jacarecanga. Com toda essa efervescência do trem como um potencial na economia, surgiu a Casa Machado, Usina São Judas Thadeu (óleo Paturi); lá mais adiante em rumo a Floresta o trem passou a atender a Brasil Oiticica e a Cia Ceará Têxtil; pela linha Sul a Siqueira Gurgel.

Ah! Jacarecanga fora contemplado pelo trem suburbano de Maracanaú, fazendo paradas na Avenida Francisco Sá, pois, até 1980 os moradores iam de trem para o Centro às 6.15 h e 13.15 h, retornando as 11.15 e às 18.30. À noite o trem prosseguia até ao hoje Município de Acarape.

 Pois bem, as linhas Norte e Sul faziam convergência na Estação Central e, no Jacarecanga como linha divisória, formou-se um triângulo, aonde trens cargueiros vindos de Otávio Bonfim para Álvaro Weyne entravam, no mesmo; serviu esse triângulo para as reversões de locomotivas e composições de passageiros. Eu cheguei a ser Buchecheiros junto com a meninada, como se diz: Pegávamos Bigus.

Mas, tudo o que é bom passa. As fábricas inexistem, e com a chegada do Metrô de Fortaleza, desde 2010 que o trem fora arrancado do Jacarecanga.

A Vila São José fica só a contemplar de modo amistoso, a passagem do Veiculo Leve Sobre Trilhos – VLT na linha Oeste, que nem se quer olha para minha Vila. Possa ser à posteriori.

O trem chorando por força do Metrô, abandonou a área e nunca mais passou….

 

                               José Augusto

Local da Parada do Trem Suburbano.

 

                           

                            Do autor

Trilhos pela Rua Jacinto de Matos.

O Muro era a Entrada do Ramal da Casa Machado.

Está hoje tudo diferente.

 

 Inteiração: O TREM DOS OPERÁRIOS

 

Quem foi morador da Vila São José no bairro Jacarecanga no início da década dos anos de 1960, contemplou a passagem de uma locomotiva á vapor, a chamada “Maria Fumaça”, que correndo e bufando pelas válvulas, despertava a curiosidade de todos.

Na minha meninice se existia algo que amedrontava os guris do meu tempo, era aquela coisa preta correndo e cantando o poema de Manuel Bandeira “Café com Pão”. Pobres crianças! Não puderam alcançar emocionante viagem de trem com máquinas à lenha, afinal a última locomotiva desse tipo circulou no Ceará em 1 de janeiro de 1963.

Mas, que trem era aquele? Respondeu-me um ferroviário: “É o trem dos operários das oficinas do Urubu”. A Vila onde nasci acompanhava todo o movimento ferroviário, pois, é lá onde havia a separação das linhas de Baturité e Sobral formando o triângulo aonde, ainda se faziam as reversões.

Em 1972 ingressei no Colégio ginasial José Waldo Ribeiro Ramos (ex-Centro Educacional Ferroviário), tornando-me passageiro do trem dos operários. Para orgulho nosso, nesse trem tinha um carro exclusivo para os estudantes. Passei então do lado de fora, para o de dentro. A composição tinha cinco carros e era assistida pelo condutor de nome Daniel, que revezava com o Sr. Antônio.

A Partida do trem dos operários da estação Prof. João Felipe, era às 6.30 h e tinha 12 minutos de percurso obedecendo as seguintes paradas: Padre Mororó, Marinha, Vila Assis, Francisco Sá, Av. Pasteur e a estação de Álvaro Weyne que, na época era depois da passagem de nível da Av. Dr. Themberg.

Quando aluno/ passageiro desse trem, o mesmo era puxado pelas locomotivas   Brockville (pequenina) e a Whitcomb nº 623 que tinha motor de caterpillar (era um barulhão!).

Em 1981 ingressei no quadro de funcionários da RFFSA (extinta). Então com muita responsabilidade, passei a ter acesso a documentos, oportunidades para entrevistas, reprodução de fotografias e assim resgatar a história daquele trem de minha infância.

Portanto, recuemos no tempo.

# As oficinas da então Estrada de Ferro de Baturité foram inauguradas aos 9 de junho de 1880, sendo diretor da Companhia o Engº Amarílio Olinda de Vasconcelos, que nomeou José da Rocha e Silva para ser seu mestre geral. Devido ao crescimento da Empresa, expansão no pátio de manobras, a construção de armazéns e uma grande reforma por que passou a RVC em 1917, a Estação Central não podia mais comportar os trabalhos de manutenção mecânica. Então foram iniciados os estudos quanto ao local da futura instalação das oficinas.

Em 1922 o Sr. Antônio Joaquim Carvalho Junior (Cel. Carvalho), havia doado para a União um terreno no bairro do Urubu, bem na beira da estrada da Barra do Ceará. A Rede de Viação Cearense nesse tempo estava sob o comando da Inspetoria Federal de Obras Contra as Secas – IFOCS, atual DNOCS.

O Inspetor Arrojado Lisboa conseguiu junto ao Governo federal que, o referido terreno fosse destinado para a RVC e assim, construir o tão almejado complexo arquitetônico. Com o terreno à disposição da RVC e já sob o comando de Demósthenes Rockert, o engenheiro Otávio Bonfim ficou como encarregado para consolidar o projeto junto a Firma “Alfredo Dolabela Portela & Cia”. Assim em 1929 com os galpões já prontos, começaram o translado das máquinas e o material pesado.

Enfim na gestão de Abraão Leite, aos 4 de outubro de 1930 ocorreu a apoteótica inauguração das Oficinas. Por portaria, é criado o “Trem dos Operários” que passaria a ser tracionado por uma locomotiva “The Baldwin Locomotive Work” tipo 0-4-0, cuja fabricação é de abril de 1922. Essa é a máquina que depois assombraria as crianças, da minha bucólica Vila da Usina São José.

Pois bem, em 1977 o Eng. José Walter Barbosa Cavalcante (Prefeito José walter) que era o Superintendente Adjunto de Operações – SOP, determinou sua erradicação

É como disse Raquel de Queiroz: “Menino criado em beira de linha fica com o trem no sangue”.

                    Álbum da RVC

 Trem dos Operários tracionado pela Locomotiva Baldwin nº 30.

 

                            Foto do autor

 Locomotiva 30 ainda preservada

 

 

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