Assis Lima
Assis Lima

CINETEATRO MAJESTIC E O QUEIMA RAPARIGAL

 

O Cearense já nasceu para a cultura da molecagem, quando da inauguração do Cine Theatro Majestic com o cartaz da italiana Fátima Miris, no dia 14 de julho de 1917, coisa que a sociedade daquele tempo não tolerava, bem como atualmente quando os conservadores ainda são antagônicos.

Foi um impacto esta atração negociada por Plácido Carvalho, que na Europa esteve. Ele queria inovar algo e amadurecer nossa Fortaleza nos seus anos de Bélle Époque.

 

Transformista Italiana Fátima Miris

 

A edificação era de propriedade de Plácido Carvalho, cuja exploração fora da Firma Ribeiro & Cia, que mantinha um pacto firmado entre Luis Severiano Ribeiro com o Capitalista Alfredo Salgado.

O colossal Cineteatro Majestic-Palace tinha o piso de madeira com uma riqueza arquitetônico e, por tabela, instrumento de sonoplastia, afinal os cavalos dos filmes de faroeste pareciam ter invadido a sala de projeção, quando o público empolgado batia os pés no piso de madeira de lei e encerada. Ele imitava o som dos galopes.

 

 

Depois dos filmes e das peças teatrais – diversões – refúgio mais cobiçadas na ausência de shoppings -, era comum que a praça ficasse ocupada por famílias tomando sorvete, olhando as vitrines das boutiques e irrigando as veias de um Centro da cidade já repleto de diferenças sociais, dentro e fora das salas de projeção.

 

 

O Majestic foi o primeiro a ter o espaço dividido nos setores de plateia, camarote e geral. O pessoal da geral, lugar mais barato, ficava jogando coisas nos camarotes e na plateia. Esses eram chamados de moleques. Só pela estrutura, o Cine já permitia esse tipo de manifestação de repúdio às classes superiores. A vaia ao sol naquele 30 de janeiro de 1942 na praça do Ferreira, é prova cabal do comportamento irreverente dos que havia nascidos, e dos que  ainda iriam nascer, como o caso do autor destas linhas que chegou ao mundo em 1958, sendo privilegiado por Deus por oferecer seu berço na Terra da Luz.

 

Em destaque a mutilada casa do Boticário Ferreira

 

Assim como várias construções que se perderam entre prédios e comércios modernos, o Majestic hoje resiste apenas na lembrança de quem viveu em uma Capital ainda inspirada nos hábitos europeus. Majestic era um edifício imponente, de vários andares, e a sala de projeção era também um teatro.

 

 

O Majestic não teve felicidade, mas a construção teria sido essencial e deveria ter sido preservada, porque revelaria não só a arquitetura, mas as práticas, a indumentária, os usos dos espaços e os valores sociais da época que existiu. As residências que não foram alicerçadas pelas elites fortalezenses também são destacadas, como parte importante do DNA da cidade.

Ainda existe muitas construções populares que deveriam ser preservadas, pois, resgatam o modo de como moraram as camadas mais populares

 

Incêndio de 1955

 

Dois Incêndios e o Fim

Foram dois devastadores incêndios que sofreu este majestoso cineteatro.

O primeiro foi em 4 de abril de 1955, onde parcialmente foi perdido sua entrada e a ampla sala de espera com seus espelhos e cartazes que ficavam no andar térreo. A catástrofe consumiu as Lojas Brasileiras 4400 e assim atraiu a atenção de toda cidade. Sobreviveu a estrutura metálica e a entrada ficou pelos fundos do prédio pela Rua Barão do Rio Branco nº 1171. Passou uma temporada na reparação de danos, mas voltou a funcionar, por ter seus proprietários condições para tal.

 

Fotos colhidas do Edifício Diogo 1968

 

O segundo incêndio ocorreu na madrugada do dia 1 de janeiro de 1968, aí o fogo devorou por completo. Assim foi o fim do primeiro prédio da cidade que mal tinha completado cinquenta anos de existência.

Para a operação dos bombeiros fora utilizados oito carros, setenta homens sob o comando do Tenente Moacir Sousa. O incêndio havia começado por volta das 2 h e daquela vez os bombeiros tiveram de ter a habilidade para o isolamento, para não serem atingidos os empreendimentos do entorno tipo Farmácia Pasteur, Lojas Ocapana, Flama, dentre as pela rua Barão do Rio Branco.

Por volta das 7.30 h, o sinalizador com a corneta recebia ordem para o toque de recolher dos heróis, para retornarem para a Praça do Liceu, onde ainda fica o quartel.

Segundo populares, em algum lugar escondido algum moleque Gritou: “Queima Raparigal”.

Dizem que este segundo incêndio fora criminoso, mas nada foi provado e nem eu estou afirmando. Ficou no lendário da Praça do Ferreira, recém mostrengado.

Queima Raparigal!

O fato dos cabarés ficarem nos altos dos prédios (o andar térreo era ocupado por lojas e pontos comerciais) atendia à questão do isolamento das profissionais do sexo da chamada sociedade regular. Uma ocorrência do final dos anos 30, explica a origem de famosa expressão ainda hoje corrente em Fortaleza. Uma das lojas da Rua Floriano Peixoto sofreu um incêndio em plena manhã de sábado. Nos altos do sobrado havia uma pensão de mulheres. As inquilinas, que tinham trabalhado até de madrugada, ainda dormiam quando começou o alvoroço na rua. Populares tentavam apagar o fogo com baldes d’água, enquanto as chamas subiam perigosamente, já ameaçando o sobrado. As mulheres, despertadas pelos gritos da multidão, do alto das janelas, pediam socorro, braços erguidos, descabeladas, ainda em seus trajes de dormir, imploravam por ajuda no maior desespero: salvem a gente pelo amor de Deus!!! . Foi quando um gaiato, numa explosão de sadismo, gritou da rua: “Queima Raparigal !!”. Juarez Leitão, escritor.

 

Tudo o que restou

Fontes:

História do Corpo de Bombeiros Sapadores do Ceará. IOCE. 1973.

Jornal O povo 1 de fevereiro de 1942

Juarez Leitão. Sábado, Estação de Viver

Miguel Ângelo de Azevedo: Cronologia Ilustrada de Fortaleza; BNB , 2001

Sebastião Rogério Ponte, pesquisador das reformas urbanas e sociais da cidade.

 

 

 

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