Assis Lima
Assis Lima

OTÁVIO BONFIM QUE SAUDADE DO TREM

 

 

 

Quando o trem da Companhia Cearense da Via Férrea de Baturité (depois Rede de Viação Cearense – RVC, RFFSA e hoje Metrô de Fortaleza, começou a circular em 1873, a linha que partia da Estação Central fazia uma grande curva acentuada, penetrando na Rua Trilho de Ferro, atual Tristão Gonçalves que, devido ao afogamento no Centro de Fortaleza fizera com que o diretor da RVC, Dr. Henrique Eduardo Couto Fernandes desse início em 1916, aos estudos para o desvio dos trilhos, livrando o trânsito e a população de acidentes.

Atendendo sua consultoria técnica e recebendo o sinal verde das autoridades, Couto Fernandes iniciou as obras ficando os trilhos em paralelo com a já avançada linha do Soure (Caucaia); após a ponte metálica sobre o Riacho Jacarecanga, a via fez uma curva de 90º nas terras do Coronel Pedro Filomeno.

Ponte Sobre o Rio Jacarecanga

 

A primeira grande reforma ocorrida naquele pedaço, diz a história, que foi no início da Rua Dom Jerônimo. Há quase cem anos e ainda na areia, com projeto aprovado pelo Intendente Guilherme Rocha, fora construído um forno crematório, onde o lixo da cidade era incinerado; por o terreno pertencer a Intendência de Fortaleza (Prefeitura a partir de 1914) o mesmo abrigaria a Sumov, hoje Secretaria Regional.

A chamada “Linha Nova”, que havia tido o batimento da primeira estaca em 1920, foi inaugurada em dia 31de dezembro de 1922; a primeira parada era no Matadouro. Chamou-se assim pois, a matança de gado para o abastecimento de carne verde de Fortaleza era no local em que ergueram a estação. Em 1945 a direção RVC ordenaria que os trens suburbanos parassem na já Avenida Francisco Sá.

 

 

Com o novo trecho Estação central – Matadouro, a Rede de Viação juntamente com os órgãos governamentais oficializaram quatro passagens de nível assim descritas: Avenida Tomaz Pompeu (atual Filomeno Gomes), Estrada do Urubu (que já foi Demósthenes Rochert e agora Francisco Sá), Açude João Lopes (Sargento Hermínio) e o Caminho do Barro vermelho que se denominou Avenida Bezerra de Menezes, cuja inauguração de seu alargamento data de 1 de julho de 1959.

 

 

A Estação Matadouro passou a se chamar Otávio Bonfim aos 24 de fevereiro de 1926. O ponto de junção dos trilhos deu-se no Sitio que pertenceu ao abolicionista José Correia do Amaral (Curva do Amaral/Porangabussu), tal como esteve até 2010.

O Estado do Ceará era ícone na cotonicultura e, escoava sua safra na maior parte por ferrovia. Os empresários construíam estrategicamente seus empreendimentos nas proximidades da Via férrea. Os desvios particulares eram construídos para o atendimento de seus interesses. Foi o caso da Usina Gurgel de propriedade da Firma Teófilo Gurgel valente, que se chamou “Usina ceará”, inaugurada no dia das crianças de 1919. A Casa Machado, empresa também de beneficiamento de caroço de algodão, na entrada do Pirambú fez também o seu desvio para carga e descarga de vagões.

O destino às vezes coloca em nossa frente coisas efêmeras, e a Estação de Otávio Bonfim parece ser uma delas, se não vejamos:

– Inaugurada a linda estação, a mesma ficou com o nome de “Matadouro” de 31 de dezembro de 1922 até 24 de fevereiro de 1926;

– Já com o nome de Otávio Bonfim a fachada ficou até 1979, pois em 20 de maio de 1980 era inaugurada uma Estação, com plataformas para receber carros Pidner  pela Coordenadoria de Transporte Metropolitano da RFFSA, transferida hoje para a Companhia Cearense de Transporte Metropolitano – Metrô de Fortaleza.

– O depósito de lenhas que se localizava no pátio de Otavio Bonfim, aos 28 de janeiro de 1937 foi transferido para o Bairro das Damas no km 8 (atual Couto Fernandes) ficando lá até 1963; No local do depósito de lenhas, foi inaugurada aos 26 de dezembro de 1938 a Vila Operária da RVC.

Agora com o projeto Metrofor, o trem abandonou a área. É a inviabilização das coisas e espero o meu leitor concordar. A Siqueira Gurgel (fabricava o sabonete singel, sabão pavão, Óleo Pajeú e a gordura de coco Cariri) e a Casa Machado já desapareceram do local, e os cargueiros passaram a trafegar por uma variante na corrente de tráfego Pajuçara-Caucaia saindo de circulação do perímetro urbano.

É lamentável para uma empresa de transporte perder usuários, mas temos que viver a realidade; Otávio Bonfim é bem assistido por transportes alternativos, afinal a questão física da área continua imutável. Defronte passa a movimentada Avenida Bezerra de Menezes, sendo ainda ao Leste a entrada do Beco dos Pintos e ao Norte o Cercado Zé Padre.

Hoje quando chego ao cruzamento da Via férrea com a Avenida Bezerra de Menezes, quanta diferença. Não vejo mais saindo pela Rua Justiniano de Serpa os ônibus que faziam as linhas Granja Paraíso e nem o Dona Tereza. Cadê os ônibus para o Sitio Ipanema, Vila dos Industriários, Campo do Pio, os elétricos? E a farmácia da D. Rosélia na esquina?

Bem, o trem voltar a circular pela Tristão Gonçalves é a história se repetindo, mas uma nova história que facilitará a vida do fortalezense gerando ainda mais progresso.

O bairro Otávio Bonfim já está sentindo saudade do seu trem, porém, no silêncio da meditação vai compreender, se bem que já tem gente até cantando: “Que saudade temos do trem!”.

 

 

Nota: Octávio Bonfim. Engenheiro civil formado pela Escola Politécnica do Rio de Janeiro. Foi Chefe do Setor de Obras do Departamento de Via Permanente. Elaborou o projeto de construção das Oficinas do Urubu e Construiu o Ramal Ferroviário de Orós. Estava no comando do Setor de tráfego da Rede de Viação Cearense – RVC quando aos 30 de Julho de 1925, veio a falecer, com 41 anos de idade..

 

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