Assis Lima
Assis Lima

O RÁDIO – MANUSCRITO DE ANTHONY SANTIAGO

PRAT

 

Aureolado pela divulgação que antecedeu a minha chegada, dos meus conhecimentos de rádio e os meus sucessos em São Paulo, certa manhã a visita dos Srs. Francisco Riquet Nogueira e Silvio de Castro, respectivamente Presidente e Secretário do Ceará Rádio Clube, expuseram de maneira frenaz a razão de suas visitas e ao mesmo tempo em que historiaram asa dificuldades que enfrentavam naquela novel organização.

Adquirida a aparelhagem na Phillips do Brasil pelos irmãos Dummar, organizaram-se em sociedade, para cumprirem as exigências do regulamento que regia a exploração de divulgação em “broadcasting”.  A Phillips ao fornecer o transmissor cariou o seu técnico para efetuar a montagem e as experiências preliminares.

O Sr. Gonzalez, tudo fez, porém, não conseguiu fazer funcionar a estação, até que fracassado, regressou à sua sede, abandonando os interesses da companhia, e este com evasivas desonestas e fé embolsada também abandonou seus compromissos. Estava assim há 5 meses, uma aparelhagem em completa inutilidade e o anseio do povo cearense em ouvir a sua estação.

Por outro lado, os Dummar com os negócios de rádio sacrificados devido o grande estoque de aparelhos “Philco” importados e impossibilitados de vendê-los. Era uma situação de vexame e prejuízos comerciais.

Aceitando tal convite e sem nenhum entendimento sobre honorários, ali compareci para um detalhado exame, com testes rigorosos em tosos os órgãos do transmissor.  Tratava-se de um equipamento simples, pequeno e (..) de tamanho descomunal para impressionar certamente o leigo. Tudo que compunha os seus 500 watts, ½  kilo watts estava em perfeitas condições.

A antena apesar de precária, e grosseiramente instalada, como irradiante, poderia receber perfeitamente a sua carga.

O último exame foi na fonte de alimentação. Na época ainda não existiam os sistema de retificadores e válvulas e para o suprimento de alta tensão, utilizarem um grupo conversor esco(…) de 2.000 volts meus relhos similares – existindo uma bateria de flutuação, instalada erroneamente junto a tal grupo, as emeneções(…) do ácido sulfúrico ate(…) impiedosamente o induzido da alta tensão, provocando oxidação nas bobinas e lâminas de delicado ce(..), coisa que o Sr. Gonzalez não atinou.

Silenciei sobre o defeito, e já senhor da situação, acerquei-me dos proprietários e me comprometi fazer funcionar a estação dentro de poucos dias, contanto que me dessem certo (…) para agir e principalmente (…) de leigos como auxiliares bem como perguntinhas tolas.

Grande era o numero dos entendidos que ali se encontraram. Fui prontamente atendido em minhas exigências. Depois de uma trabalheira horrível, consegui localizar meu velho amigo, João Bezerra o mais competente técnico de motores e geradores ainda hoje existente em Fortaleza.

Depois de uma terapêutica exaustiva de varias horas, consegui liberta-lo de uma das suas (…) habituais. (…) comparecemos e depois de acurados exames, foi confirmado o meu diagnóstico, porém só estavam afetadas  2 bobinas.

Para proceder a um novo enrolamento, seriam necessários vários dias, então optei pela sua (…) de isolarmos as bobinas afetadas, em (…) com a redução de 160 volts na voltagem total, o que não prejudicaria em nada nem mesmo na potência do transmissor – pelo mesmo momento, fizemos a transferência para outro local da bateria de flutuações e depois de 5 horas de trabalho, estaremos vitoriosos. Liguei rapidamente a estação, retoquei a sintonia, observando que todos os controles atuaram perfeitamente.

Anunciei a diretoria, que no dia seguinte às 14 horas (sábado) entraria com a estação no ar. Por precaução, retirei o cristal e o guardei as escondidas.

No dia seguinte, ao chegar no local nos altos da Casa Mesiano, onde hoje funciona a Cimaipinto, encontrei uma verdadeira aglomeração dos “entendidos e técnicos” , que quiseram assistir meu fracasso.

Depois de 40 minutos, propositais sob as vistas de todos meus competidores, gritei para os estúdios para iniciarem a programação preparada.

Tudo correu bem e o comportamento das válvulas era perfeito. Em poucos minutos os telefones anunciaram a pureza e o volume das emissões.Caetano de Vasconcelos foi o primeiro locutor que operou no Ceará, e as irradiações se prolongaram até as 22 horas.

Despertei muito gente boa. (..) diretor técnico, função que ainda exerço, porquanto nenhum ato foi lavrado. Comemoraremos a minha vitória no restaurante Remar na Praia de Iracema, para (…) de muitos e decepções de muitos outros.

Os sírios Dummar, perfeitos representantes do nunca me pegaram, mas proporcionaram embora ótimas peixadas e muito whisky. Felizmente no encerramento dos programas, dois meses depois, aproveitando a passagem da comitiva presidencial, o Dr. Getúlio Vargas e o General Góis Monteiro, inauguraram oficialmente a PRAT e nessa ocasião, pela primeira vez na “minha vida” apertei a mão de um presidente da Republica.

Anos depois, já ausente, na reforma dos serviços de radiocomunicações, foi substituído o prefixo pelo atual de PRE-9.

Materialmente nada usufruí, mas em compensação, firmei um conceito que ainda hoje ecoando em todo território nacional, o meu nome é citado e certado.

Fizeram justiça!

 

Rio, 23.1.64

Assina: Anthony Santiago.

 

 

 

O RÁDIO NO CEARÁ

          -1924-

Já nos fins de 1924, era fundada em Fortaleza, o “Club Rádio do ceará”, tendo  sede o pomposo palacete dos “Diários” na rua Barão do Rio Branco.

A sua primeira diretoria era composta do Engº. Elesbão de castro Veloso, Desembargador Carlos Livino de Carvalho, Carlos Mesiano, Francisco Riquet Nogueira, Clovis Meton, Augusto Mena Barreto, Mister Watson e Henrique Soares.

Entre os inúmeros associados e fundadores, constaram os nomes de Antonio de Alencar Santiago Hit Moraes e Oswaldo Fernandes.

A fundação foi revestida de grande solenidade com fotografias, jornais, banda de música militar, sem faltar o pomposo e interminável discurso do Dr. Carlos Mota.

No centro do salão, numa mesa especial e coberta pelo pavilhão nacional, estava o primeiro receptor ali chegado, e de fabricação francesa, com 4  (…) , 3 baterias de acumuladores (a – b- c) , e um imponente auto-falante de corneta.

O momento do seu descortinamento, foi saudado por prolongada salva de palmas acompanhado do hino nacional.

Constara o receptor de uma caixa de tamanho descomunal, de madeira e um painel de ebonite com 4 “ dial”, cheia de algarismos com legendas indicadores em francês, e na porta exterior superior, espetados nos soquetes as 4 válvulas Lee Forest, de tamanho respeitável.

Imediatamente ocorreram para o seu lado, dando especificações técnicas o Carlos Mesiano, que daquilo nada entendia e o mulato Henrique Soares, arrasado em técnico de grandes Cebedzis(…)e acatado peos seus termos complicados e nebulosos, decorados na convitenoic do Mr. Watson. O “Monstro” imprimiu respeito pelo se(…). logo em seguida, procederam ante o expectativa e ansiedade geral, as experiências que se prolongaram até alta madrugada, e o bicho não “ piou”!.

Depois de todo encenação e dias depois chegaram a conclusão de que uma válvula não acendia, estava queimada. Substituída esta, retirada de uma caixa de sobre(…) que acompanho o aparelho, verificaram os “Técnicos”, que o  ocu(..) nariz sido devido uma troca dos fios “+” e “-“!

As sessões eram diárias e com muita assistência, feita e ligação correta, o bicho apitou e apitou alto! Alegria geral, satisfação estampada em todos, e “alguém” comentou: “ Deve ser o apito de algum trem, chegando na estação emissora”!. Esse alguém era o enfatuado Mena Barreto, coitado morreu sem nunca conseguir penetrar em rádio!

Henrique Soares, tomando os controles, iniciou uma série de apitos em várias tonalidades e isso foi prolongado até que cessou tudo. As baterias estavam esgotadas!

Novas decepções e novos experimentos nos dias seguintes e enquanto isso, os comentários e as opiniões Técnicas eram as mais desor(...)! predominando no entanto que a causa primordial era a antena inadequada .

Uma noite já muito tarde, resolveram ir a casa do Henrique Soares no Jacarecanga,  levando o “Bicho”, para experimentar uma das cinco antenas existentes e vários”Terras” construídos de acordo com as instruções.

Lá fomos à pé, conduzindo o pesado aparelho apoiado em duas tábuas. Os numerosos e confiantes acompanhantes, muito assemelharam a um cortejo fúnebre. Ninguém falara, só a esperança de todos no alto conceito técnico do Henrique! Não fomos de automóvel, para evitar trepidações, Mesiano não quis retirar as válvulas receado trocá-la de lugar! A salinha ficou apinhada; desciam do telhado vários fios etiquetados para identificarem as antenas e os terras.

Todos foram experimentados e sem resultados; somente apitos estridentes e “Alguém” loucamente disse: “Esse trem do mesma Barreto não para!”.

Na infância do rádio todos os aparelhos existentes eram regenerativos, e o apito era o efeito da capacidade. A aproximação das pessoas ocasionavam apitos e suas tonalidades. Verificaram que quando todos estavam distantes, cessavam ou diminuíam tais ruídos, e quando com os pés levantados se ouvia a razão. Convencionou-se, que todos fizessem de cócoras, em posições grotescas nos tamboretes que constituíam a mobília do Henrique! Figuras respeitáveis, naquelas posições devem uma impressão caricata e de operações nas necessidades fisiológicas. Resultado: Negativo.

A coisa foi esfriando, até que ficou muito reduzido o número de “aficionados”, e entre eles, eu, Oswaldo Fernandes e Carlos Mesiano, incessável e persistente que nunca desanimou.

Baixinho, gordinho, barrigudinho, carequinha, com um eterno colete preto, trazendo o azeite de doce o alho, e com sua gesticulação espalhafatosa, própria dos italianos, duas explicações as mais absurdas – presunçosa e pedante de Pedro Riquet, que dominando a assistência dizia: ! “Ou é KDKA ou WGY”, acentuando bem a pronuncia inglesa: “KA-DÊ-KUE-EI ou DABLIU-GI-UAI”… e acertou pela primeira e última vez na vida em mal(…) de rádio.

Mal sabíamos, que só existiam estas duas estações na América do norte.depois foi confirmada, era KDKA, e o “Peter” criou fama! Dias depois, foi escolhido outro local e este ficou definitivamente instalado na Praça de pelotas. Uma noite não funcionou! Expectativa geral. Defeito? Baterias? Antena? Chamaram o Henrique.

O mulato ao chegar examinou tudo – perfeito – e foi a janela.. Ventava muito. Virando-se para a assistência declarou doutrinalmente: “Hoje nada teremos-as ondas estão muito esparsas”! Aceitaram sua abalizada opinião. Santa ignorância.

Alvitrou trocas de locais – foi um Deus nos acuda as nossas peregrinações! “Água mole em pedra dura, tanto bate até que fura”.

Uma noite, já tarde, no Centro Artístico, na Tristão Gonçalves, cedido pelo Cel. Antônio Diogo, o “Bicho” finalmente desentupiu. Que coisa estupenda! Quanta nitidez o volume! Uma musica suave estava sendo irradiada, não se sabe de onde! Chamaram o Cel. Diogo e família, e os telefones não pararam! Apareceu gente de toda parte. Ouvimos musicas até o esgotamento da bateria. Ficou ajustado que ninguém mexeria em nada até a noite seguinte. Todo Club, compareceu as 19. h e de imediato passamos a ouvir a mesma estação. Era uma questão de sintonia.

Os técnicos desconheciam o manejo ou ajuste dos “Diais”.

Alguém perguntou: “de onde é essa musica”? Ante o silêncio, ouvimos com ênfase a voz juntamente com Hil Moraes e Oswaldo Fernandes, fizemos uma rede de radiotelegrafia, utilizando bobinas Ford, e recebendo em galenos, com resultados surpreendentes.

Residindo na Volta da Jurema, cariava até mensagens dali! O Club tomou novo impulso e importou um transmissor de 25 watts, de fabricação francesa. Preparávamos um to(…) estúdio e fomos organizando programas e festivais , como speakers,  revezamos eu e Mesiano. Já possuindo conhecimentos seguros sobre rádio, a custa de livros e revistas manuseava diariamente, fui tomando gosto e discutindo com os entendidos.

Construí um receptor de 3 válvulas, utilizando o esquema do circuito Sohnell. Os diais eram confeccionados com velhos discos de gramofone, e as suas engrenagens milimétricas com rede de relógios velhos!

Henrique Soares, de técnico passou a vendedor de peças adquiridas não sei a onde e nem os meios.  Girou-se a vivalidade técnica entre eu e Hil Moraes. Este respondeu a minha montagem com outro, utilizando circuito: “Porry-Obliggs”. Com isso passamos a ser os entendidos e os procurados.

O comércio local, interessado no “vírus” que atendera a cidade, passou a importar o material, merecendo destaque a Casa Edisom,  de propriedade do Sr. Machado e Centro de discussões aceleradas, onde predominou os termos técnicos, decorados com sacrifícios das mais recentes publicações adquiridas a custa de sacrificadas e privações pessoais – Dr. Elesbão Veloso, meu Chefe importou da América, um “kit” completo, material de ótima qualidade.

Fui o encarregado da montagem. Caprichei e fiz construir numa boa marcenaria, uma caixa , pelo modelo americano. Depois de pronto e experimentado, foi posto em exposição na Livraria Americana, na Praça do Ferreira com um cartão de (…) gravado:

Propriedade: Engenheiro Elesbão Veloso;

Montagem: Anthony Santiago.

Juntou gente e criei fama.

Enquanto isso o meu amigo, Geraldo Fernandes, que explorava um varejo de cigarros, excelente instalação no Meison Art-noveaux , feliz miseravelmente com o desvio dos apurados na tentativa de manter um receptor o que infelizmente nunca conseguiu.

Foi esse o pioneirismo do rádio no Ceará, o meu entusiasmo pela técnica e os primeiros passos, será enfrentar a marcha vertiginosa da técnica eletrônica e os meus conhecimentos de hoje.

 

 

Rio 16.09.63.

Assina: Anthony Santiago.

 

      TRANSCRITO DO ORIGINAL PERTENCENTE AO ARQUIVO NIREZ, GENTILMENTE CEDIDO.

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