Acarape Terra Redentora
Era o toque final do clarim da vitória,
Que ecoava da cidade aos longínquos desertos.
Uns riam de prazer – outros a extinta escória
Dos déspotas, depois, achincalham, libertos!
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Foi um dia de festa e regozijo. As praças
Regurgitavam. É o grande ideal que venceu…
Do instante mais feliz que Acarape viveu!
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E os seus cabelos, salamândricas serpentes,
Que se estorcem venenosas, pelo chão,
Semelhavam, depois, as tétricas correntes
Cujos elos quebrou, sozinha, Redenção.
Trecho de um poema de Otacílio de Azevedo
(Filho de Redenção que chegou a Fortaleza em 1910, e falecera em 1978).
Com apenas cinco anos de existência, a estação de Acarape tornou-se um marco histórico em todo o Império do Brasil. O dia de Acarape abria ao Ceará, um novo calendário, cuja última hora iria ser a da meia noite de 25 de março de 1884. Um trem especial conduziu os abolicionistas e, a meia légua do desembarque o local Acarape de Cima passou denominar-se Redenção, devido à libertação dos escravos e, como o Ceará foi o primeiro do Império a fazer tal, tem a nomenclatura de “Terra da Luz”. O lugarejo do ponto do traçado da estrada de ferro e a estação ferroviária continuaram com o nome de Acarape, sendo até num passado não distante distrito de Redenção.
Em Fortaleza, as lojas comerciais anunciavam os seus artigos para esse 25 de março, e um dia antes a coisa foi acelerada na Praça Castro Carreira (da Estação), e fora aproveitado o pavilhão do Grande Circo Americano, ou seja, a Companhia Eqüestre e Ginástica de propriedade de João Gomes Ribeiro que estava localizado na esquina das ruas da cadeia (General Sampaio) e Travessa das Flores (Castro e Silva).
Debaixo desse armado no centro do logradouro, após a chegada do trem com a comitiva, houve a realização da solenidade oficial da libertação escravagista tudo sob a orientação de Jose Correia do Amaral, Dr. Henrique Théberge, Heráclito Sousa Leão, José Severiano de Oliveira, Francisco Cerqueira Mano e Cândido Alves Maia. A cidade não coube dentro dessa concha nos desabafos e júbilo. A Praça da Estação fora apoteoticamente visitada, pois, Fortaleza nesse marco histórico parou. Todos se dirigiam para a estação ferroviária Central popularmente conhecida como Baturité. Os registros fotográficos antigos que o leitor conferirá, foi graças ao patrocínio da Sociedade Perseverança e Porvir, movimento precursor do Centro Abolicionista Cearense.
Acarape tem a seguinte formação toponímica: Acará= Peixe + Pe = Por em ou No, donde se conclui por “No caminho dos Acarás”.
A riqueza do solo de sua zona era o cal, que já foi considerado o melhor do Estado, além da cultura de cana de açúcar que foi atravessado pela ravina Acarape. As águas dessa ravina foram represadas por uma barragem de argila situada fora da Cidade.
A estação de Acarape foi situada por conveniência do traçado, a três quilômetros da então fluorescente cidade do mesmo nome, encravada no meio de um grande povo, cuja inauguração data de 26 de outubro de 1879 com 76,437 m acima do nível do mar.
“Quando encampada a Baturité*, por magnanimidade e influencia direta do Imperador, nova pendência se levantou em que o Ceará teve de ser vencido. Ao aproximar-se de Acarape, a estrada devia chegar até as imediações da cidade e dali seguir ou por Itapaí à mercê de um túnel ou contornar a serra de Cantagalo, a fim de aproveitar a estrada já existente para piões e comboios até a cidade de Baturité. A má vontade do engenheiro Julius Pinkas à população da cidade de Acarape fez a linha tomar outra direção. Seguiu de calaboca e numa rampa de cinco quilômetros, a dezoito por mil, vingou a montanha de Itapaí, com aterros, cortes… e curvas repetidas até Canoas. Esta ascensão de Itapaí mereceu que o sábio engenheiro Capanema, indignado, dissesse que aquilo não era um erro, mas um crime de engenharia”. João Brígido sobre o traçado da Estrada de Ferro de Baturité (Jornal Unitário 20-2-1908). * julho de 1878. Convém salientar que, a cidade de Acarape de que fala João Brígido é hoje o território da cidade de turismo histórico Redenção.
As novas gerações desconhecem a importância que esta estação teve no desenvolvimento da economia local, pois, a intensa operação dos trabalhos que efetuou a colocava em competição com as demais estações da antiga Rede de Viação Cearense. Devido ao aclive acentuado em serpentina da Serra do Itapaí, Acarape tornou-se uma estação recompositora, de onde as composições que vinha de Fortaleza com destino ao sertão central, tinham que sofrerem reduções em suas tonelagens. Boa parada, pois, o açude Acarape do Meio que tinha a melhor água da região, abastecia as locomotivas que, até 1950 eram todas à vapor. As lenhas com boa qualidade tinham como certas a sua venda para dois grandes clientes: A própria RVC e a The Ceará Tramway Power Light, que as utilizavam em suas caldeiras e nos fogões domiciliares.
A economia local movimentava um bom número de vagões que eram despachados com algodão, açúcar, além dos produtos de inicio tais como calcário, couros salgados, peles curtidas, madeiras de construção, café e aguardente, vindos dos mais diversos locais dentre os quais menciono o Exu, Pau Branco e o Sitio Garapa.
Aos 9 de maio de 1962 surgiu a Usina São João de Bezerra Lima & Cia. que, somou com a Usina Cariri carregando em seus desvios particulares os seus produtos tais como: algodão beneficiado, Óleo vegetal, sabão in natura… Tudo isso sem por em conta os trens de passageiros P1/P4 que deslocava todo aquele pessoal. Muitos se deslocavam para o lado de Baturité e a maioria para Fortaleza, e mais, desde 1963 tinha um comboio suburbano de freqüência diária que lá pernoitava, saindo as 4.40 h o e retornando às 18.30 h.
O povo de Acarape agora sobrevivendo com transportes rodoviários olha para sua estação porém, não assiste mais o desfile dos trens cargueiros da Companhia Ferroviária do Nordeste, depois Transnordestina Logística S/A.
A vida continua.